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  • Fonte: Carolina Ramos

... do livro “Sempre” de  Carolina RamosCarolina 12 12 2017 400 a9b82

 

Dizia a borboleta: “Acertas,  sou vaidosa!

Não creias que ao dizer alcanças me insultar.

Em pleno paraíso eu vivo e sou formosa...

dos dons que recebi não posso me ufanar?!

 

É meu o espaço azul... em  toda a plenitude!

Um reino que se expande ao céus  e sem limites!

Bendigo a insensatez que o teu ciúme alude:

Eleva-me!  Que ao solo, a rastejar, tu grites!

 

Pobre lagarta! Adverso é o teu destino!

A poeira da jornada encobre-te o horizonte;

enquanto eu vejo, do alto, o mundo pequenino,

um seixo é um muro hostil, vedando a tua fronte!

 

As flores a corola entreabrem ao meu beijo.

E o néctar, perfumado, ofertam-me a sorrir!

Ao chegares, porém, quanta repulsa eu vejo

no trêmulo e baldado anseio de fugir!

 

E é fácil de entender... Sutil, minha carícia

supera na leveza o airoso colibri.

Meu suave e lento aflar, do zéfiro a blandícia,

a rodopiar no azul, vencer eu consegui.

 

Pisas tu, vulgarmente, em volteios sinuosos,

a pétala aromada e pálida de horror!

Maculas com teus pés, grosseiros, pegajosos,

a face virginal, tão pura, de uma flor!

 

Que enorme diferença existe entre nós duas!

Tua figura hedionda exalta-me a beleza!

Abjeta, a rastejar na humildade, acentuas

meu grácil volutear, meu porte de princesa!

 

E então?... ousas lagarta, ainda censurar-me?!

A mim, que espelho o anil dos céus... das águas rasas...

e douro a mão profana e impura  se  ao tocar-me,

desliza no ouro em pó que trago em minhas asas!

 

Verme inútil... Adeus! A vida eu tenho à espera!

Vaidosa, sim, eu sou! - afirma o que quiseres!

Em resposta, me entrego ao sol da primavera

que de flores recobre  espinhos que me deres!”

 

A lagarta, impassível, segue silenciosa.

Leviana, a  borboleta,  aflando asas de seda,

afasta-se a ondular na brisa perfumosa,

a perder-se, feliz... na  florida vereda!

 

Borboleta insensata! Em seu orgulho olvida

que um dia foi lagarta... e feia e desprezada!

Há tanta gente assim, vaidosa, já esquecida

do quanto rastejou,  humilde, sem ter nada!

 

É mais fácil brindar os louros do presente,

a taça de ilusões a borbulhar à farta!

- E a humana borboleta esquece, ingenuamente,

que a farsa não destrói... seu rastro de lagarta!