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  • Fonte: Marcia Etelli Coelho

Márcia Etelli Coelho homenageia Afiz Sadi.

Eu conheci Afiz Sadi em 1978 quando ele era professor de Urologia da Escola Paulista de Medicina e eu estava no quinto ano da Faculdade e por coincidência o seu filho, Marcus Vinicius, era meu colega de turma.

A imagem que eu tinha dele era de uma pessoa exigente e que sabia explicar muito bem a matéria.

Nem de longe eu imaginava que ele tinha talento literário, muito menos a sensibilidade de poeta. Só soube disso quando eu entrei na Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – SOBRAMES SP – e conheci Hélio Begliomini (um dos seus seletos alunos) que me informou dessa particularidade do Professor Sadi.

E a primeira poesia que eu li dele foi:

CORRER DO TEMPOmarcia ettelli coelho 2a ce10eMárcia Etelli Coelho

Quanto mais o tempo passa
Sinto o passar dos anos.
Não sinto o passar do tempo
E com o tempo, os desenganos.

Quisera que nesta vida
O tempo jamais passasse.
Quanto mais o tempo passa
A vida para... Se o tempo parasse?

Será que a vida andaria?
Será que fim não teria?
E ao tempo o que ofertaria?
Se tempo à vida daria?

Mas tempo e vida andam juntos.
A vida luta com o tempo.
O tempo dá tempo à vida.
E a vida é luta sem tempo.

Para o Dr. Sadi o tempo apresentava uma conotação especial e ele soube aproveitá-lo, dividindo-o entre a Medicina e a Literatura.

Na Medicina, apesar ter nascido em Jardinópolis (São Paulo), graduou-se pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Especializou-se em Urologia na Escola Paulista de Medicina e foi professor titular de lá e da Faculdade de Medicina de Santos e também do ABC.

Era Membro de várias importantes Academias de Medicina e autor de importantes livros sobre Urologia.

Participou de inúmeros Congressos e Jornadas, sempre com destaque, pois apresentava profundo conhecimento da Medicina e uma grande habilidade na oratória, conquistando grandes amizades tanto no Brasil como no exterior.

Na Literatura, Afiz Sadi escreveu crônicas, ensaios, biografias, editoriais de revistas. Mas se destacou mesmo foi como poeta.

Poesias em Vários Tons (1971); O Tempo e a Vida (s/d); Ritmo e Poesia (1979) Prosa & Verso (1992); e Correr do Tempo (poesias, 2008).

O interessante é que os títulos dos seus livros de poesia sempre têm uma referência ao tempo, ao ritmo, à musicalidade das palavras.

Afiz Sadi ingressou na Academia Cristã de Letras em 1982 . A posse ocorreu no anfiteatro da Escola Paulista de Medicina e, por ser o primeiro ocupante da cadeira 40, escolheu o poeta Gibran Khalil Gibran (1883-1931) como patrono. Gibran era um poeta que o Sadi admirava muito, além do fato de ambos terem origem libanesa. Não por coincidência, um dos textos mais famosos do Gibran está contido no livro O Profeta e tem como título... “O Tempo”.

Afiz Sadi ocupou a Presidência da ACL em duas gestões (1988 a 1991), sempre manifestando facilidade em organização e pesquisa, além de notável memória.

O tempo corria... E Afiz Sadi seguia com muitas atividades. Conseguia, porém, pausa para pescar, atividade na qual realmente o tempo parece andar mais devagar.

Pausa também para estudar tapetes persas. Ele tinha uma fascinação pelos tapetes, chegou até a colecioná-los. Ele era fascinado não apenas pela beleza dos tapetes, mas se aprofundou em todo o processo de confecção.

E eu estive pensando como esse hobby de tapeçaria tem uma conotação simbólica muito importante tanto para quem é médico quanto para os escritores de uma forma geral. Sim! A tapeçaria requer paciência, persistência, atenção aos detalhes, mas com um olhar para o todo... E o Afiz Sadi valorizava todas essas etapas dos artesões e com certeza aplicava essas qualidades na sua vida pessoal e profissional. Valorizava uma boa gastronomia, não apenas pela alimentação em si, mas principalmente pela interação com as pessoas. Valorizava também as viagens e tudo que ampliava sua cultura.

Na vida pessoal, Afiz Sadi casou-se com Leila e teve três filhos: Marcos Vinicius, Alexandre Augusto e Carlos Henrique.

Marcos Vinicius especializou-se também em Urologia, sendo professor e membro da Academia de Medicina de São Paulo.

Mas o tempo continuava correndo... E Afiz Sadi veio a falecer em 30 de junho de 2010, aos 85 anos, deixando como legado o amor da família, a admiração dos amigos, a sensibilidade literária e uma grande contribuição para a Medicina.

E eu vou terminar essa homenagem, lendo um poema que eu escrevi, inspirada na brilhante personalidade de Afiz Sadi.

Um homem com alma de artista,
mas da Medicina fez sua profissão.
Que foi professor na Escola Paulista
com inteligência e dedicação.

O olhar de poeta escreveu alguns livros.
Poesia em tons sobre o tempo e a vida.
O tempo que corre, agregando amigos.
A vida em espaço onde o amor é guarida.

Na Academia Cristã, grande mérito
de a ter presidido por duas gestões.
Nas letras, nos sonhos, honrou o pretérito.
Um facho de luz entre constelações.

Na tapeçaria, fascínio e lazer.
A pausa ideal para a lida agitada.
Os fios se entrelaçam e ensinam a ver
beleza na trama que, aos poucos, se ata.

Afiz é o nome desse homem capaz!
Sadi complementa um nobre legado.
E assim como Assis, instrumento de paz,
seu nome será para sempre lembrado.