Se na minha vida houve algum ano ruim, tinha sido aquele – 1972. Realmente, recordo-me como o pior que já passei.
Acabara de cursar, no período da tarde, o segundo ano do colegial no Instituto Educacional Jardim França, e houvera me transferido para o tradicional Instituto Educacional Albino César, onde concluiria, no período noturno, o último ano do segundo grau. Tudo isso para frequentar, pela manhã, o Curso Preparatório Objetivo (cursinho) na Avenida Paulista.
À época parecia que a minha geração era mais engajada com ideais do que as de hoje, e não perder tempo na vida era uma meta a ser perseguida.
Assim, minha mãe me despertava entre 5h00 e 5h15min. Tomava rapidamente o café e andava alguns quarteirões até a casa da Virgínia, onde dividíamos as despesas da carona até o cursinho com mais dois outros colegas: o Ari e a Iskuhi. Eram seis aulas diárias das 7 às 13 horas. Regressava à casa por volta das 14 horas. Depois do almoço estudava até as 18h, quando, após o banho e o jantar, dirigia-me de ônibus até o colegial, que, na época, chamava-se científico.
As aulas terminavam às 23 horas, quando regressava também de ônibus para casa, por volta de 23h30min, salvo rara carona que antecipava minha chegada.
Essa rotina de segunda a sexta-feira, dia após dia, semana após semana, mês após mês, era quebrada com os famosos “Simulados” (provas de avaliação) mensais ou quinzenais, nos finais de semana.
Além do cansaço físico atribuído à maratona diária, o que se tornava implacável era o abalo psicológico, não somente pelos estudos diversos visando a concluir o colegial e entrar na faculdade, como também e principalmente a vivência do acirrado clima de competição, fomentado pelos professores do colegial, mas, sobretudo do cursinho.
Transcorrido o ano, que passou como foguete, mas que durou uma eternidade (!), candidatei-me a quatro escolas de medicina com grande afluência de interessados: Faculdades do ABC, Santos, Taubaté e Jundiaí. Tive a felicidade de ingressar em Jundiaí conquistando uma de suas 61 vagas anuais (Figura 1).
Lembro-me da alegria incontida que experimentei. Era como se tivesse recebendo os louros da vitória de uma maratona ou da corrida de Fórmula 1. A sensação de inutilidade e de insuficiência que o ambiente do cursinho nos impingia tinha sido superada.
A certeza de que estaria apalpando como realidade meu sonho de ser médico, acalentado desde os seis anos de idade, era maravilhosa e simplesmente intraduzível por palavras!
Infelizmente, a Virgínia e o Ari renovaram a matrícula do cursinho por mais tempo e não tiveram a mesma felicidade. Acabaram ingressando em cursos diversos de áreas não biológicas. A Iskuhi, que tencionava desde o início fazer direito, teve o privilégio de ingressar na tradicional faculdade do Largo São Francisco.
Aquele ano de 1972 marcou a minha vida e a minha trajetória profissional. Foi um remédio acerbo que Deus havia me oferecido e que tinha valido muitíssimo a pena provar.