Frances de Azevedo - 08/2024
"Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura" Ovídeo - Poeta Romano
As pedras sempre me fascinaram. Quando criança/jovem, cheguei a colecioná-las numa caixa de sapatos. Eram pedras de múltiplos formatos e composições, como seixos rolados, quartzo, mica e outros...
Quando viajava, tinha que trazer uma pedra para me sentir satisfeita, para compor minha adorável coleção que, vez por outra, lá ia eu conferir. Era um momento mágico!
Posto não entendida no assunto, eu procurava saber de que matéria determinada pedra era constituída. As que continham pontos brilhantes chamavam mais minha atenção. O formato, textura, cor, também eram critérios para a escolha.
Mas, o que é pedra e o porquê de eu estar escrevendo esta crônica?!
Segundo os léxicos, Pedra: matéria mineral sólida, dura, da natureza das rochas; substância dura e compacta que forma as rochas; fragmento de rocha.
O que me levou a apreciá-las não sei. Simplesmente, sinto-me atraída. Talvez, lá no fundo do meu ser, como poeta que sou, eu vislumbre a magia que elas carregam.
Recentemente, em abril deste ano (2024), com meu sobrinho Wander e irmã caçula Francinei, por quase trinta dias, viajei pelo Marrocos (Cordilheira do Atlas); sul/nordeste da Espanha (Sierra Nevada dentre outras Montanhas); Gibraltar (Rochedo de Gibraltar ou Coluna de Hércules); Andorra (Pirineus Orientais) onde, naturalmente, os complexos rochosos me atraíram sobremaneira.
Na Espanha, tive a oportunidade de visitar o Caminito Del Rey, na região da Andaluzia, próximo de Málaga, no Desfiladeiro de Gaitanejo e Chorros. Trata-se de diversas passarelas - algumas atingindo até cem metros de altura! -encravadas nas rochas majestosas, altíssimas (300 metros). Lá se encontra a primeira hidrelétrica da Espanha, com água cor de esmeralda. Uma vista belíssima se descortina lá da passarela!
Também fui a Setenil de Las Bodegas: lugar abraçado literalmente pelas rochas com estabelecimentos comerciais: restaurantes, lojas, com teto rochoso. Inacreditável!
E Andorra, que dorme num vale profundo, no coração dos Pirineus Orientais, tanto que para acessar nosso quarto, no hotel, no quinto andar, ao invés de subirmos de elevador, descíamos. Isso mesmo! Incrível! Também incrível foi, ao acordar, logo cedo, apreciarmos a neve caindo, cobrindo os telhados como flocos de algodão. E, ao longe, os picos nevados. Mais tarde, nos aproximamos destes. A neve já havia se acumulado no caminho. As rochas estavam vestidas de branco...
Foi exatamente na capital, Andorra-a-Velha, que ocorreu o encontro, adrede combinado, com meu sobrinho do coração: Cumino, e sua esposa Alda, amigos de longa data da nossa família, para, assim, terminarmos nossa viagem em Barcelona. E foi nesta cidade, capital da Catalunha, que o episódio motivador desta crônica ocorreu. Explico: estávamos à beira mar (Mediterrâneo), à noite, após delicioso jantar, quando me deparei com várias pedras. Encontrei o paraíso! Aliás, encontramos, pois, minha irmã também é aficionada por elas. Ao apanhá-las, deparei-me com a pedra que ilustra esta crônica. Não sei o porquê, naquele momento, pensei: “vou dá-la ao meu sobrinho do coração”. Para minha surpresa, ele ficou bastante emocionando e me relatou a seguinte história: “quando viajava com o pai pelo mundo, era tradição, este recolher pedras ao redor do mediterrâneo e, depois, inserir o nome do local onde foi encontrada”.
A primeira pedra foi em Alexandria/Egito. Ele guarda essa lembrança maravilhosa desde que seu pai partiu...
Já na Bíblia, - o livro mais lido do mundo - encontramos a palavra pedra: Aquele que não tiver pecado, atire a primeira pedra: palavras de Jesus que significam que somente aquele que está isento de pecados poderá julgar os outros.
De Carlos Drummond de Andrade, recordo-me do célebre poema: No Meio do Caminho: “No meio do caminho tinha uma pedra/tinha uma pedra no meio do caminho /tinha uma pedra/no meio do caminho tinha uma pedra. ”
Pedras no caminho, guardo todas. (Fernando Pessoa).
Nestas citações, pedra é empregada metaforicamente, onde, nesta última, a magnifica alusão aos problemas que temos que enfrentar.
Uma palavra dita, é como uma pedra atirada. Se torna inesquecível para quem recebeu e nem o tempo poderá curar a dor daquela palavra ouvida. (Yasmini Agatha).
Conforme Fabricio Tavares de Moraes, ao se referir à figura da pedra (=palavra) nas poesias de João Cabral de Melo Neto, conclui: “Portanto, pode- se dizer que Cabral faz da imagem da Pedra uma representação e um símbolo de sua própria poesia: dura e fria, mas, ao mesmo tempo, extremamente forte e firme. ”
Em que pesem tais comparações, metáforas, temos que pedra - pedaço de rocha - é matéria mineral, cuja existência data de bilhões de anos e foi utilizada como instrumento pelo Homo habilis há mais de dois milhões de anos, sendo, inclusive, objeto de estudos para datação da terra.
Há pedras que são famosas no mundo todo, atraindo visitantes, cantadas em prosa e verso, sendo marcos de encontros, de divisas. Muito fotografadas.
Na cidade de São Paulo, mais precisamente em São Bento do Sapucaí, há a conhecida Pedra do Baú, na Serra da Mantiqueira. Recordo-me bem desta, pois, quando ia à Paraisópolis, cidade ao sul de Minas Gerais, onde mamãe nasceu, sempre a avistava ao longe, além do que, ouvia muitas histórias a seu respeito.
No Paraná, conheci o Parque Estadual de Vila Velha, com formações geológicas incríveis, onde pedras, em diversos formatos, compõem uma paisagem de outro planeta!
Em 1987, quando viajei com minha sobrinha Roberta, (então com oito anos de idade), para Teresina, Belém do Pará e São Luis do Maranhão, tive a oportunidade de visitar um sítio arqueológico semelhante ao do Parque Estadual de Vila Velha, cujo nome, infelizmente, não me recordo. Lembro-me que fazia um calor de quarenta graus, tanto que comprei um chapéu para ela. Porém, lembro-me perfeitamente das magníficas e milenares formações rochosas!
Temos que pedras são imprescindíveis às edificações de palácios, castelos, casas, edifícios, pisos, estradas, muros, templos, monumentos, obeliscos, tais como as pirâmides do Egito, Coliseu, Stonehenge (Inglaterra) e Stonehenge da Amazônia (Brasil), Exército de Xian, Cidade de Pompeia, Muralha da China. No Brasil, no Rio de Janeiro: o Cristo Redentor; no Ceará: a Estátua do Padre Cícero; em São Paulo/Capital: Obelisco Mausoléu aos Heróis de 32...
E as tão cobiçadas pedras preciosas?!
Tenho um anel de ametista que me foi dado por um namorado, pelo qual tenho grande apreço por me recordar da pessoa afável que tinha por mim amor tão grande...
Tive a oportunidade de conhecer a região de Cristalina, a cidade dos Cristais, em Goiás, que consta ser a maior reserva do mundo! Mergulhei literalmente nas pedras ao visitar essa região!
As pedras brasileiras são famosas, sendo a mais cobiçada a Turmalina Paraíba, de cor azul!
O tema é longo, porém findo por aqui, onde noto que não poetei sobre elas! Então, agora, no rolar destas, escrevo Rolando Pedras:
Muitas pedras vi rolar:
De lágrimas de tristeza,
De saudade infinita,
De partidas inesperadas...
Muitas pedras vi rolar:
De corações partidos
De amizades desfeitas
De casas demolidas...
Muitas pedras vi rolar:
De ilusão de uma vida
Transcorrida em vão
De um tempo que não teve tempo
De naquele minuto
Segurar minha mão...
Muitas pedras, muitas pedras...
Frances de Azevedo - Cadeira 39 da ACL