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Frances de Azevedo

(Quem vive sem loucura não é tão sábio quanto pensa. François La Rochefoucauld)

guido f4fafPintura de Guido Palomba 

A Cadeira 33, da Academia Cristã de Letras, tem como titular Guido Arturo Palomba, sendo Patrono Juscelino Kubitschek de Oliveira.

Como se sabe, Palomba é especialista em Psiquiatria Forense, com atuação em casos célebres, junto aos Tribunais Judiciários do Estado de São Paulo, de grande repercussão em nosso país, entre outros: O Maníaco do Parque (Francisco de Assis Pereira); Suzana Von Richthofen, Caso Pesseghini (Marcelo Eduardo Bovo Pesseghini, Menino Henry Borel.

Coleciona cerca de quinze mil laudos e pareceres!

Foi médico-chefe do manicômio Judiciário de São Paulo e, em suas inúmeras entrevistas, relata sua atuação com estórias pungentes sobre - o que eu costumo chamar - o outro lado da vida nesta vida.

Não será aqui, neste espaço, que o currículo do meu Confrade Guido será exposto, não só por extenso e denso, como por eu não ser bibliografa e, principalmente, por ser apaixonadíssima pela área de sua atuação, - tanto quanto meu Confrade o é, - onde, pois, tentarei expor algumas questões.

Esse meu interesse, confesso, não é de hoje, e vem se acentuando logo após ser admitida na ACL, quando, para minha enorme satisfação, me vi tão próxima a ele.

Obviamente, já o conhecia nominalmente, pois a fama o precede; fama esta que não abala, absolutamente, sua amabilidade para com todos.

Aliás, aproveito este espaço, para dizer que o trajar do Confrade Palomba é “uma loucura de elegância! ”

Em uma de suas entrevistas, Guido cita Hitler, Mussolini e Kadafi, como fanáticos por sangue, violência e crueldade: são os que sofrem de transtorno fanático.

Transtorno, como se sabe, é uma disfunção da atividade cerebral, podendo provocar prejuízos de ordem emocional e física, como o raciocínio, alteração de humor, o comportamento, memória e concentração, ou seja, a vida normal de uma pessoa.

Para os leigos, - nesses eu me incluo – quando se deparam com esses acontecimentos ditos anormais, difícil é compreendê-los, pois seus autores psicopatas, sociopatas, loucos (Loucura moral/Loucura lúcida), ou mais exatamente, condutopatas, - como prefere Palomba -, se enquadram na área da psiquiatria forense.

Segundo Guido Palomba, o condutopata não rompe com a realidade, não tem comportamento esquisito, não é mais inteligente, não é doente mental. Ele não possui valores de ordem moral. Com a deformidade de conduta, os condutopatas possuem um comprometimento dos valores éticos, morais e afetivos. Estes valores funcionam como freios, tanto para desejos de afeto como sentimento: desejo doentio, permitindo o ato criminoso.

Afinal, o que é ser normal?

Aqui, vamos considerar o contexto sociocultural de nosso país, eis que ser normal depende de diversos fatores culturais e sociais. O que para um é considerado normal pode não ser considerado normal para outro. Normal é seguir a maioria. O que é aceito tranquilamente, regularmente. O que é tido como padrão para a maioria da população. Ter um comportamento aceito pela sociedade.

Psiquiatria: é uma das especialidades da Medicina responsável pelo diagnóstico e tratamento dos chamados transtornos mentais e de comportamento atuando com a prevenção, o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação dos diferentes modos de manifestações das doenças mentais em geral. Wikipédia.

A reação exacerbada para com tais casos advém por não se enquadrar no que consideramos normalidade.

A loucura faz parte do universo do psicopata, ou melhor, o condutopata pode ser considerado louco?

Não, pois na loucura há alucinações e delírios. Na condutopatia, estes não ocorrem, pois o condutopata não rompe com a realidade (Palomba).

Neste ponto, eu pergunto: será que um dia enlouqueci, pois tive um AGT (Amnésia Global Transitória) ?!

Explico. Tal se deu quando sob forte estresse, em 2015. Aparentemente, eu estava tranquila ante a um novo desafio: o de, pela vez primeira, palestrar na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo. Segundo consta, eu cheguei, sentei-me na primeira fileira, reservada aos palestrantes, fui chamada a ocupar meu lugar à mesa, à frente de um auditório lotado. Proferi minha palestra. Disseram que fui bem. Até declamei. Ao terminar, perguntei à Presidente da Comissão da Mulher, Kátia Boulos, onde eu estava, como fui parar naquele local!

Fiquei fora de mim, cerca de quatro horas. Quando “voltei” ao meu estado normal, estava no Pronto Socorro do Hospital Santa Maggiore, falando sem parar, tendo a meu lado minha irmã primogênita e, de outro, a presidente da Comissão da Mulher. Esse retorno se deu tranquilamente. Não senti nada. Também não me recordei de absolutamente nada desde o momento que me sentei à espera de ser convocada à minha fala.

Posteriormente, preocupada, consultei um Psiquiatra. Diagnóstico: o já apontado acima. Sem maiores consequências.

Esse episódio me fez mudar o ritmo de minha vida. Desacelerar em todos os segmentos desta. Mudei-me para Sorocaba. Afastei-me da Capital/SP, onde sempre vivi.

Lá fiquei por três anos. Nunca mais tive absolutamente nada...

Se a loucura é considerada pela sociedade como atos sem sentido e pensamentos anormais, será que tive um momento de loucura?!

Se tive, não sei, não percebi, não senti, não doeu. Preocupou-me, certamente, porém veio e passou rápido.

Se trago tal particularidade é para abrir o leque sobre o tema muitas vezes – se não quase sempre – visto de maneira desvirtuada, por desconhecimento ou interpretação errônea do que realmente seja a loucura.

Para Freud, a normalidade é um mito, onde, pois, nós humanos, carregarmos um pouco de loucura. Será mesmo?!

As coisas mais belas são ditadas pela loucura e escritas pela razão. (André Gide).

Essas palavras que escrevo me protegem da completa loucura. (Charles Bukowski).

A psicologia nunca poderá dizer a verdade sobre loucura, pois é a loucura que detém a verdade da psicologia. (Michel Foucault).

Creio que quase sempre é preciso um golpe de loucura para se construir um destino. (Marguerite Yourcenar).

Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura. (Friedrich Nietzsche).

Há uma fina linha entre genialidade e loucura. Eu apaguei essa linha. (Oscar Levant).

Que é a vida, senão uma série de loucuras inesperadas. (George Bernard Shaw).

Nunca existiu uma grande inteligência sem uma veia de loucura. (Aristóteles).

A loucura, longe de ser uma anomalia, é a condição normal humana. (Fernando Pessoa).

Por vezes o estado de loucura ajuda na recuperação de um grande estresse. (Frances de Azevedo).

A loucura, sob a ótica da psiquiatria, é tida como doença mental, passível de tratamento especifico. Deixando este aspecto de lado, vou enveredar por um caminho multifacetado da loucura, como o que encontramos nas letras musicais, nos poemas, nos aspectos da vida cotidiana, onde ela é vista não como algo terrível, - que faz mal - mas sim, por incrível que pareça, deve fazer parte de nossa vida para que esta seja melhor!

Tanto é que, no amor, na música, na poesia, as palavras loucura e louco transitam tranquilamente, sendo cunhadas expressões de toda ordem, como as relatadas acima. Posto metaforicamente empregada, temos que sempre vista pelo lado positivo/bom: aqui a chamada loucura boa, não aquela considerada como doença mental. A loucura que extrai de nós o melhor para fazermos coisas diferentes, sui generis, personalíssimas, que nos diferenciam dos simples mortais, como Ludwig Van Beethoven, gênio da música, que era portador de transtorno bipolar; Vincent Van Gogh, pintor neoimpressionista, famoso em todo mundo, sofria de ataques epiléticos; Edgar Alan Poe, escritor inglês, portador de distúrbio bipolar; John Forbes Nash, (Prémio Nobel em economia em 1994), matemático esquizofrênico, todos, tidos como loucos!

A linha entre a loucura e genialidade é mais tênue do que se pode imaginar. Há gênios normais, onde, pois, não necessariamente terem um quê de loucura.

Na música, a loucura se apresenta, como na conhecida Balada para um louco de Astor Piazzolla: Viva! Viva!!! Viva os loucos que inventaram o amor!

Loucura de Adriana Calcanhoto: Eu comecei a cometer loucuras por aquele amor...

Poetas, aliás por muitos considerados loucos, versejam sobre o tema, como Mario Quintana no poema Esperança: Lá no alto de décimo segundo andar do Ano/Vive uma louca chamada Esperança...

E o célebre poema Ismália, de Alphonsus de Guimarães: Quando Ismália enlouqueceu/Pôs-se na torre a sonhar...

Cecília Meireles, em Vinho: A taça foi brilhante e rara: Mas, com certeza, enlouqueci! E desse vinho que bebi/Se originou minha loucura.

Fernando Pessoa, em Esta espécie de Loucura: Esta espécie de loucura/Que é pouco chamar talento...

Dizem que: De poeta e de louco, todo mundo tem um pouco.

Poeta sou. E louca, será que sou?!

Se sou louca por ser poeta, posto, até agora, não tenha versejado sobre o tema, não me importo, pois essa loucura poética me faz viajar por sendas inimagináveis, mantendo minha lucidez.

 

Frances de Azevedo -  Cadeira 39 da ACL -  Patronesse: Madre Maria Teodora Voiron: