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 Raquel Naveira

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Que encantador “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de Saint-Éxupery (1900-1944). Um livro que marcou minha juventude como também a de milhares de leitores. Fascinante a história desse Principezinho de cabelos cor de trigo, que vivia sozinho num planeta do tamanho de uma casa que tinha três vulcões, dois ativos e um extinto. Havia uma flor, uma rosa bela e orgulhosa que tirou a serenidade do seu mundo e do seu coração. Isso o levou a fazer uma viagem pelo cosmos em busca de amigos e acabou parando na Terra. A fábula parece simples, mas os personagens são cheios de simbolismos. As reflexões psicológicas são profundas: vida, morte, amor, espiritualidade, sede de conhecimento, aventuras, encontros e desencontros, solidão. Um alerta para que não esqueçamos nunca da criança que fomos e somos.

Em pleno deserto do Saara, um piloto adormecido sobre a areia, o próprio autor, tem uma visão: um pedacinho de gente falante. O Principezinho lhe pedia para desenhar um carneiro e fazia muitas perguntas. Sim, o escritor e ilustrador Saint-Exupéry era, de fato, piloto. Fazia a linha Toulouse-Casablanca-Dacar. Chefiou um posto no sul do Marrocos. Retornou à Europa para voar com as Forças Francesas Livres durante a Segunda Guerra Mundial. Lutou ao lado dos aliados. Sua última tarefa foi recolher informações sobre os movimentos de tropas alemãs. Seu avião foi abatido e seu corpo jamais encontrado. Desaparecido ainda jovem, não testemunhou o sucesso de seu livro.

Depois de andar por rochas e pela neve, o Principezinho descobre uma estrada que o levou a um jardim cheio de rosas. Ele se decepciona: a sua flor lhe dissera que ela era a única de sua espécie em todo o universo e eis que havia cinco mil rosas vermelhas iguaizinhas à dele, num só jardim. Chorou de tristeza. É nesse momento que aparece a Raposa debaixo de uma macieira. O Principezinho confessa que procura amigos. A Raposa explica que, para ter amigos, é preciso “criar laços”, “cativar”, dedicar tempo ao outro, ter necessidade um do outro, ser importante e especial para quem se cativa.

O conceito de “diversidade” hoje liga-se à multiplicidade de características que tornam as pessoas diferentes umas das outras como etnia, cultura, gênero, religião, idade, raça, deficiência ou habilidades. São questões complexas, mas superficiais, externas, diante das lições do Principezinho de que “só se vê bem com o coração porque o essencial é invisível aos olhos”. Somos todos “rosas de um imenso jardim”, mas cada rosa/criatura é única, irrepetível, com suas pétalas nervosas, seus olhos voltados para o nada, sua existência intensa e breve. Se alguém ama uma rosa, ela é como um exemplar em milhões e milhões de estrelas. Ficamos felizes quando lembramos que nossa rosa está lá, em algum lugar.

A Raposa prossegue dizendo que é preciso ritos para dar emoção, alegria e significado ao amor, para fazer uma hora distinta de outras. Sugere que o Principezinho vá rever as rosas para compreender que a dele, a que ele regou, ouviu, cuidou é exclusiva. É a sua rosa.

Sábia aquela Raposa. Representa a amizade esperada, contada, ansiada. A que derrama o óleo da vida. A que dá brilho à nossa caminhada, pois é útil, consoladora, estimulante. A que nos ajuda a suportar as angústias. A que influi nas ideias, sentimentos e gostos. Uma amizade dinâmica e consciente. A Raposa é aquele amigo poético, com quem se assiste a um glorioso pôr do sol. Somos todos parte de um conjunto. Temos de viver para nós e para nossos semelhantes. A verdadeira inclusão é evitar divisões, separações, canteiros destroçados, trilhas de incompreensão, sementes de discórdia, pois, afinal, todos sofremos na nossa condição efêmera de humanas rosas.

Lendo “O Pequeno Príncipe”, penso que devemos ser mão para a dor do outro. Tenhamos essa coragem.