Geraldo Nunes*
Com o reinício das aulas presenciais nas universidades, após a fatídica passagem entre nós do coronavírus, voltaram as indagações de quem circula pela parte interna da Faculdade de Direito do Largo São Francisco sobre a estátua de um ex-professor daquela instituição, cujo nome se assemelha ao do patriarca da independência.
Os estudiosos em história de São Paulo e do Brasil gostam de falar dele e de sua participação política importante em defesa da libertação dos escravos.
Defender publicamente a abolição da escravatura e depois ser convidado por Dom Pedro II para ser o “conselheiro – mor”, foi um privilégio que só coube a ele, José Bonifácio de Andrada e Silva, “o moço”, pertencente à segunda geração após os Andradas que lutaram pela Independência.
Era filho de Martim Francisco, irmão do “patriarca” e dele não foi só sobrinho, mas também neto, pois este concedeu sua segunda filha legítima, Gabriela Frederica, em casamento com o tio.
Essas coisas do século 19 é que me deixam chocado, tio se casar com sobrinha para não ter que dividir a herança com outras famílias? Era o interesse pelo dinheiro se sobrepondo ao amor.
Mas do casamento do tio Martim com a sobrinha Gabriela, nasceu “o moço”, mais tarde grão-mestre dos que passaram pela velha e sempre nova Academia de Direito.
O poeta Paulo Bomfim, que completaria 95 anos em 30 de setembro, se ainda estivesse entre nós, faria elogios se perguntado sobre "o moço". Nos disse o poeta certa vez, adorar o ardor dos discursos liberais entrelaçados por um toque de poesia romântica.
Nascido em 1827, na cidade de Bordeaux - França, por ocasião do exílio da família após dissolução da Assembleia Constituinte de 1823 por D. Pedro I, Bonifácio respondeu sempre como cidadão brasileiro.
O ano de seu nascimento coincide com a instituição dos cursos jurídicos no Brasil que fizeram dele um dos oradores mais aplaudidos de sua época.
Sua mãe teve outros filhos além deste, que se notabilizou na política, ao defender em pleno século XIX a instituição do voto para os analfabetos.
Mesmo no cargo de ministro manifestou-se publicamente, em 1864, a favor da libertação imediata de todos os escravos, sem indenização para os seus proprietários.
Mesmo criticado pelos que se opunham às suas ideias, contou com o prestígio de Dom Pedro II, que chegou o convidou para ser presidente do Conselho de Ministros, em 1883, cargo equivalente ao de primeiro-ministro no parlamentarismo europeu de hoje.
José Bonifácio rejeitou o cargo, acredito que antevendo a queda para breve do regime monárquico.
O apelido de “o moço” era usado para distingui-lo do seu tio e avô, José Bonifácio de Andrada e Silva, “o patriarca”.
Acima, o vemos na foto que serviu de base para a escultura de sua estátua. Contam que quando tinha 14 anos, ingressou na Escola Militar da Corte, da qual se afastou em 1846, sem terminar o curso.
Ao dar preferência a uma carreira civil, ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo e sua formatura aconteceu em 1853, após completar 26 anos de idade.
Depois, foi professor na mesma instituição e teve alunos proeminentes na vida pública como Castro Alves, Joaquim Nabuco e Afonso Pena.
Rui Barbosa, foi um de seus maiores admiradores, a ponto de ter viajado a São Paulo para fazer um pronunciamento em homenagem ao "moço", quando soube de seu falecimento aos 59 anos, em 26 de outubro de 1886. O sepultamento aconteceu em Santos, a cidade dos Andradas.
Após ler esta crônica, quem se dirigir ao prédio da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, já saberá quem foi José Bonifácio, “o moço”.
Geraldo Nunes* - jornalista, eleito para a cadeira 27 da Academia Cristã de Letras