Geraldo Nunes – Crônicas para serem lidas no Rádio 1 –
Queridos confrades, confreiras, público em geral.
Durante 14 anos de minha vida, entre 1994 e 2008, apresentei pela Rádio Eldorado AM um programa chamado São Paulo de Todos os Tempos, cuja finalidade era resgatar acontecimentos do cotidiano guardados na lembrança dos antigos moradores desta cidade que é a maior entre todas as capitais brasileiras.
Em cada edição semanal levávamos ao ar, logo na abertura, uma crônica de enaltecimento ao assunto que seria tratado e assim, logo no início, cultivar a memória afetiva dos ouvintes. Para nossa surpresa, encontramos perdidas em uma de minhas gavetas, uma série dessas crônicas radiofônicas inseridas em um pen drive cujo texto foi produzido em linguagem radiofônica, que por característica as frases curtas no formato de manchetes para serem lidas em voz alta, em ritmo contínuo e ao mesmo tempo pausado.
Diante de tamanha curiosidade, tomei a iniciativa de reavivar a partir de agora, algumas dessas crônicas perdidas e trazê-las de volta, através do nosso portal pertencente à querida Academia Cristã de Letras - ACL. Aproveito para lançar a vocês o pequeno desafio, de lerem também em voz alta e assim, junto comigo, brincarem de se fazer rádio mesmo à distância dos microfones.
Segue então, abaixo deste maravilhoso quadro de Tarsila do Amaral, o nosso primeiro “exercício”, uma crônica escrita em 1996 sobre o bairro da Vila Esperança.
Vila Esperança
São Paulo é uma cidade de mil faces e mil feições.
Qual seria, entretanto, o verdadeiro rosto da cidade?
Bem pode ser o rosto de um bandeirante, marca registrada dos paulistas.
Pode ter também as feições dos milhares de operários que acordam cedo e no anonimato embarcam nas conduções geralmente lotadas, para mais um dia de trabalho.
O esforço diário, ajuda a construir e manter esta que é maior das metrópoles do nosso continente e se encaminha, quem sabe, para ser a maior do mundo.
Mesmo assim, paira a dúvida:
Existe alguém que tenha o verdadeiro rosto de São Paulo?
Sei que as cores do branco, do negro e do índio estão estampadas na bandeira paulista, mas depois surgiram os que vieram de fora e foram adotados pela mãe – mulher, cidade.
Nestes rostos está a face dos primeiros imigrantes europeus, o seu Giuseppe verdureiro, o Chico Leiteiro, o Manoel da padaria.
Gente anônima que ajudou construir São Paulo, ao lado de motorneiros, alfaiates, sapateiros, feirantes e tecelões.
Diversos Josés e Marias assistem diariamente o nascer do sol e a garoa do anoitecer, que enaltecem a importância do trabalho.
Deus, em sua infinita bondade, trabalhou seis dias na construção do mundo e no sétimo descansou, mas como a cidade não pode parar, mesmo aos domingos há quem trabalhe.
São Paulo é um incessante pulsar.
O programa de hoje vai descrever rostos de pessoas anônimas que moram em lugares distantes da Praça da Sé ou da Avenida Paulista e guardam consigo, bonitas histórias de seu cotidiano e sua vida.
No São Paulo de Todos os Tempos, ouviremos histórias de um bairro da zona leste que deu nome a uma canção de Adoniram Barbosa.
Este compositor, também faz parte do rosto desta São Paulo de todos os tempos.
“Vila Esperança, foi lá que eu passei, o meu primeiro carnaval
Vila Esperança, foi lá que eu conheci Maria Rosa, meu primeiro amor.
Como fui feliz, naquele fevereiro, pois tudo para mim era primeiro. Primeira rosa, primeira esperança, primeiro carnaval, primeiro amor criança...”
Geraldo Nunes* - jornalista eleito para a cadeira 27 da Academia Cristã de Letras