Lázaro Piunti
Acordei naquela manhã com o barulho da família galinácea. Dirigi-me ao quintal a tempo de ver as sete galinhas reunidas formando um círculo e, no meio, XUXA, a mais velha delas, cacarejava estridente.
O Galo Carijó e suas damas a ouviam atentamente. Fiquei estarrecido! Elas acabavam de votar, em assembleia geral, uma greve. Não mais botariam um ovo, caso suas reivindicações não fossem aceitas.
E o que pleiteavam? Inicialmente é necessário alinhavar seus protestos. Estavam cansadas de botar ovos e ver o produto do seu ventre consumido por terceiros. Ou era o Lagarto Socialista se servindo deles, ou eu - o dono da chácara. O que elas exigiam?
A: Todos os ovos postos no ninho deveriam ser preservados. Que ninguém mexesse neles, pois representariam futuros pintainhos, a continuidade da espécie.
B: Qualquer ovo, botado imprudentemente fora do ninho, ficaria para quem o achasse. Fosse eu ou o Escamado. Pressenti existir outro agente secreto se locupletando dos ovos, ao enxergar, por cima do muro divisório do quintal, um par de olhos astutos!
O meu vizinho estaria furtando ovos em minha propriedade? Pelo sim ou pelo não, me fechei em copas e tomei minhas decisões. Respeitaria o voto democrático das poedeiras e só recolheria ovos esparsos, isto é, botados fora do ninho localizado dentro do galinheiro.
O Lagarto Socialista e eu disputaríamos a produção aleatória! E quanto ao vizinho? Militarizei a área destacando o poderoso Thor, meu dálmata, como vigia. Meu cão de guarda fiel! A estratégia deu certo. Até certo ponto.
Nas duas primeiras semanas tudo funcionou satisfatoriamente.
O Lagarto abocanhava, dia sim, dia não, o seu quinhão e eu recolhia, dia não, dia sim, o meu óbolo. As galinhas punham seus ovos no ninho coletivo cuidando, felizes, dos futuros rebentos.
Em duas tardes e três noites Thor rosnou e latiu e, numa delas, vi quem o incomodava. Era o vizinho tentando saltar o muro. Como disse, o acordo funcionou bem por duas semanas, talvez vinte dias.
Ontem, de surpresa, recebi uma intimação da prefeitura. Denúncia anônima me acusou de infrator ao Meio Ambiente e explorador de animais indefesos. Multa pesada e prazo de cinco dias para fechar o galinheiro e retirar as galinhas do quintal.
O Poder Público julgava ilegal a criação de bípedes em área urbana, mas, se omitia quanto ao perigo da volta dos escorpiões que outrora infestavam o local e que motivara a ideia da criação de galinhas, conhecidas exterminadoras de aracnídeos.
Joguei a toalha! Minha minúscula propriedade está à venda! Contatos?