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 a frances de azevedo 8dee8

Mais uma vez teria que enfrentar a maratona de final de ano. Mais uma vez teria que passar pelos mesmos sentimentos, sensações, amarguras, contrapontos, corre-corre.

Desta vez, no entanto, sabia que não aguentaria, não resistiria. Estava por demais cansada, saturada. Sim, saturada. Não dava mais, mesmo. Desta vez seria definitivo. Era hora de mudar. Dar uma guinada total de 360 graus. Caso contrário, tudo continuaria do mesmo jeito, da mesma forma. Era preciso, necessário, operar, desde já, a mudança tão sonhada, tão desejada. Quanta e quanta vez se propusera a tal. Quantos sonhos planejados minuciosamente. Contudo, entrava ano, saia ano, nada mudava. Qual a razão?! Por que a sonhada mudança não acontecia?! O que era preciso para tal acontecer?! E, agora, aquela moleza, aquele estado de indolência, tomara conta de si, deixando-a numa prostração assustadora. Só pensava em dormir.

O corpo mole fizera morada em sua mente, que ansiava por continuar a sonhar, idealizar, realizar. Contudo, o físico dominava a mente. Que sensação terrível. Impotência total...
Lá, no fundo do seu pensamento, continuava a idealizar, escarafunchar novos projetos, planos de uma vida nova! Tentava, sim, sair daquele malfadado torpor. Era como se houvesse uma corda com duas pontas: a vida real puxava de um lado; do outro, algo invisível tentava levá-la para o fundo, para um mundo desconhecido, irreal, sem fim. (O chamado fundo do poço...).
Neste deambular indescritível, o tempo passava, escoava lentamente. 

Perguntava-se se não seria o tempo lá fora. Já se aproximava o verão e nesta antevéspera já havia o prenúncio de dias ensolarados, quentíssimos. O sol em todo seu esplendor, sua força, dava mostras de como seria aquele verão. 

Mas sabia que não era nada disso, suposições; meras suposições de pensamentos desordenados, que tentavam, sistematicamente, aderir à sua mente. A escravidão, então, apoderou-se daquele mínimo espaço, estendendo seus grilhões, seus tentáculos, sufocando, estrangulando...

O que fazer?!
Novamente, a eterna questão, num interregno de lucidez, veio à tona, numa tentativa, mais uma vez, de trazer a lume a realidade.
Incrível que, bastava um só impulso, um pouco mais de vontade, para tirá-la daquele mórbido torpor. Contudo, nada acontecia. A paralisação era total, geral. Estranha sensação de querer. Porém, faltava-lhe força; a paralisia impedia-a de partir para a execução. Então, dormir era a única solução.
Caminho de fuga, da boa escuridão, onde a realidade adormecia também, dando-lhe o necessário refrigério...

Estranhos são os caminhos da mente humana. Como dominar, controlar tal morbidez, a falta absoluta de vontade física, de estranho cansaço, onde o estado físico, deplorável oblitera o espírito?!
Então num repente, não mais do que num repente, tudo volta ao normal, ou próximo do normal. A vida, esta vida como nós a conhecemos, de ir e vir, pensar, planejar e executar, volta num estalar de dedos. Simples assim.

Muito estranho, realmente. Tais são os mistérios do ser humano...

Frances de Azevedo - Cadeira 39 da ACL - 28/12/2011