“Não há melhor negócio que a vida. A gente a obtém a troco de nada.” (Provérbio judaico)
Se em nosso meio, o judeu tem fama de ter bom tino comercial; de não se imiscuir intimamente com pessoas alheias à sua origem religiosa; bem como de ser pão-duro, com certeza, aprendi que tais condições não se aplicavam, peremptoriamente, a todos os hebreus. Seu semblante alegre e extrovertido, sua vontade de fazer amigos e de entrosar-se, sua simplicidade e generosidade contagiavam a todos os que puderam privar de sua amizade.
Refiro-me ao estimado amigo José Jucovsky, mais conhecido simplesmente por Jucovsky, que tive o privilégio de conhecer no seio da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – Regional do Estado de São Paulo (Sobrames – SP). Diferentemente de outros, Jucovsky era um judeu sui generis! Sem renunciar à sua condição religiosa, não somente respeitava outras religiões e sincretismos religiosos, como também era uma das pessoas mais desprendidas e de mãos-abertas que tive a oportunidade de conhecer.
José Jucovsky era soteropolitano, nascido em 13 de setembro de 1925. Graduou-se, em 1950, na Faculdade de Medicina da Universidade da Bahia. Ainda como interno exerceu, mediante concurso, na cidade de Salvador, atividades na Maternidade Climério de Oliveira, bem como de laboratorista do Leprosário Águas Claras.
Formado clinicou durante sete anos no norte do estado do Paraná, sendo diretor de uma Casa de Saúde. Transferiu-se, em 1957, para a cidade de São Paulo onde se radicou e atuou como ginecologista e obstetra. Auxiliou na ampliação do Hospital Santa Adelaide, no bairro de Santana, referência à época em maternidade, na zona norte paulistana. Juntamente com outros colegas preocupados na assistência maternal inaugurou, em 1960, o Hospital e Maternidade do Belém, na zona leste da capital. Aí chefiou durante 30 anos os serviços de obstetrícia e de neonatologia, bem como acumulou a direção clínica, condições que predispuseram a uma boa convivência com um grande número de estudantes de medicina e estagiários.
José Jucovky destacou-se também como escritor. São de sua lavra as obras: “Casal Gravido” (1a edição em 1994 e 2a edição em 2011), destinado a orientar o pré-natal de grávidas; “Louvando a Vida” (2004), onde reuniu textos de sua autoria e de seu irmão Jayme Jucovsky, então falecido; “A Dama de Branco – Romance Urbano do Recôncavo Baiano” (2012); e, já nonagenário, “O Canto das Sereias” (2016), coletânea de poesias, crônicas, contos e ensaios. A propósito, há um outro adágio judaico que bem se aplica neste contexto ao estimado Jucovsky: “Para o ignorante, a velhice é o inverno; para o instruído é a estação da colheita”.
José Jucovsky ingressou na Sobrames – SP no biênio 1999-2000, destacando-se entre seus pares. Obteve o primeiro lugar no concurso anual de poesias, recebendo o Prêmio Bernardo de Oliveira Martins, nos anos de 2007 e 2011, além de menções honrosas em 2002 e 2005. Obteve o primeiro lugar em poesias, no concurso da X Jornada Médico-Literária Paulista (2009). Ademais, teve trabalhos publicados em O Bandeirante – boletim mensal –, bem como em antologias e coletâneas da entidade.
Durante meses e meses a fio fazia questão de patrocinar, anonimamente, vinho de boa qualidade a todos os presentes nas Pizzas Literárias – tertúlias mensais da Sobrames – SP. Certa feita, interpelado por mim do porquê agia dessa forma, confidenciou-me que entre seus familiares era hábito que o ancião pagasse a conta. Como considerava a Sobrames – SP uma extensão de sua família, sentia-se não somente no dever, bem como tinha o prazer de pagar vinho a todos.
Quando a Sobrames – SP conseguiu que sua sede estivesse nas dependências da Associação Paulista de Medicina, ele, juntamente com outro estimado sobramista Manlio Mario Marco Napoli, patrocinaram todo o conjunto de prateleiras, a fim de que se pudesse albergar e custodiar a biblioteca da entidade, fato que facultou a ambos o reconhecimento – com aprovação unânime da diretoria –, do título de sócio benemérito.
Jucovsky faleceu em 5 de abril de 2019, aos 93 anos, após uma profícua existência! Com sua esposa Molkale teve uma filha Lilian, e um neto André. Sua ausência será sentida por todos nós, seus amigos, pois sentimo-nos que nos foi subtraído um dos mais diletos membros de nossa família sobrâmica, em São Paulo.