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22 Carolina Ramos 9ffd1Cronica premiada em terceiro lugar na Categoria especial Crônicas na ALAP - Academia de Letras e Artes Paranapuã

A revista chegou-lhe às mãos por acaso, escolhida entre as muitas, numa sala de espera qualquer. O artigo era encimado por uma palavra apenas: Curiosidade. Afinal, nada mais oportuno para atrair atenções do que essa palavra chave. A página contava que a águia é uma ave longeva, a mais longeva de todas as aves, chegando a viver cerca de setenta anos. Os primeiros quarenta representam o seu apogeu.

Em seguida, a ave passa por período bastante sério que lhe põe à prova o poder de decisão.

Sente que suas garras não são mais as mesmas – muito longas, maleáveis sem a força necessária para segurar a presa indispensável à sua manutenção. O bico, mais longo,  curvado na ponta, um estorvo na hora de alimentar-se; as penas, volumosas e pesadas, sério empecilho para os largos voos. Tudo somado, o impasse impõe-se: - Deixar-se morrer, ou tentar reverter o problema?

Curto o período de indecisão, antes que a águia se lance ao espaço e ganhe altura valendo-se dos parcos recursos das pesadas asas. Lá no alto da montanha, bate, por vezes seguidas o bico contra a parede de pedra, até despedaça-lo, sem que se deixe abater pela dor lancinante. E, então, a corajosa ave aguarda, pacientemente, por cerca de cento e cinquenta dias, que o bico torne a crescer. Com o novo bico, arranca, uma a uma, as unhas longas e tortas, dando lugar à volta das potentes garras que lhe garantirão a subsistência. Penas velhas e pesadas, que a impediam de voar, também são extraídas com estoicismo.

            Sem tardança, a águia revigorada lança-se ao espaço. Voo de redenção que lhe faculta mais trinta anos de vida produtiva!

            Devagarinho, a moça fechou a revista e recostou-se na poltrona, deixando descer as pálpebras cansadas. Seria isso possível?!

             A esperança pulsou em suas veias...

           Por instantes, a vida inteira passou por seus olhos fechados. Um retrocesso de  filme de curta metragem, mostrou-lhe o quanto vivera e o quanto mais poderia viver se liberta do peso das asas e das limitações impostas aos próprios voos.

             Num repente, aquela águia-mulher ergueu-se decidida, atirando-se, peito aberto, contra as paredes de pedra do seu ego...  Arrebentou-se toda... sofreu o que jamais  pensou poder suportar...mas, corajosa, libertou a ave cativa que morava dentro de si!  E, sem o peso das pesadas penas, lançou-se no espaço em busca de horizontes novos.