Geraldo Nunes
Cada vez mais pessoas estão chegando aos 100 anos de vida e não faz muito tempo, nossa confreira Márcia Etelli Coelho comentou no grupo de WhatsApp, a respeito do aniversário de uma parente dela que chegou à provecta idade.
Entre figuras tradicionais de nossa São Paulo quatrocentona me lembrei da Baronesa de Arary que viveu 101 anos. Maria Dalmácia de Lacerda Guimarães, dona do casarão projetado por Victor Dubugras, na Avenida Paulista, nº 64 - atual 1745, possuía em seu quintal árvores remanescentes da Mata Atlântica. Havia também uma bela pérgula à qual se enroscavam trepadeiras floridas, além de um pequeno tanque com chafariz onde nadavam peixes vermelhos.
A baronesa viveu metade de sua vida no século 19, ela nasceu em 1852 e morreu com 101 anos, em 1953. Descendente de nobres, era filha de Bento Lacerda Guimarães, o Barão de Araras e se aos doze anos com o seu tio, José Lacerda Guimarães, o Barão de Arary, com quem teve cinco filhos.
Essas recordações me foram passadas pela senhora Helena Maria América Sabino de Souza Queiroz Vieira de Carvalho, longo nome de uma das netas de Horácio Sabino, dono de outro antigo casarão da Paulista que agora dá lugar ao Conjunto Nacional.
A casa da baronesa foi demolida logo após sua morte e no lugar foi erguido o Edifício Baronesa de Arary com 25 andares, 590 apartamentos e cerca de 3.500 moradores, bem na esquina da Paulista com a Rua Peixoto Gomide.
O prédio que de início abrigou moradores intelectuais como o casal de atores Cacilda Becker e Walmor Chagas entrou em decadência e por muitos anos foi conhecido como "Treme-Treme da Paulista". Agora, segundo informações, está recuperado dentro das normas de segurança estabelecidas pela prefeitura.
“A Baronesa de Arary, era uma senhora muito baixinha e na festa de seu centenário à qual compareci, ela se amparou nos braços de dois netos que a levantaram. Estava lúcida, saudável e super alegre”, nos contou Helena Maria em uma antiga entrevista publicada me meu livro São Paulo de Todos os Tempos – Vol. II.
Pois bem, são chegados os tempos de cada vez mais pessoas ultrapassarem a marca dos 100 anos. Segundo estimativa da ONU, até o ano 2030, serão mais de um milhão de centenários e centenárias no mundo.
Em 1990, menos de mil pessoas no planeta possuíam essa idade, a notável diferença em apenas quarenta anos, se deve aos avanços da Medicina, da eficácia dos remédios com menos contraindicações e à qualidade de vida.
A expectativa de vida no Brasil é atualmente de 77 anos, em média. Em 1950, era de apenas 47. Mais surpreendente ainda, conforme reportagem da Agência Brasil, postada em 20 de agosto de 2024, a pessoa mais velha do mundo vive atualmente no Japão. Tomiko Itooka, nascida em 23 de maio de 1908, está com 116 anos.
Estudos recentes avisam: está nascendo a geração que poderá viver até cento e trinta anos. Percebamos que é algo como ter duas vidas dentro de uma só. Muito haverá de mudar, teremos que olhar para a vida depois dos sessenta, setenta, de outra forma, pois as pessoas continuarão ativas, úteis e economicamente ativas, como o mercado financeiro aprecia dizer.
No entanto, muito mais importante do que ativa economicamente, é estar com a cabeça boa e pronta para trabalhar naquilo de que se gosta, naquilo de que se precisa. Cabeça boa para ajudar o próximo. Cabeça boa para ajudar a família.
Imaginem, depois dos setenta ou oitenta, voltar a estudar e começar numa área distinta da que estávamos. Nós, como sociedade, precisamos nos preparar para isso. Será uma grande transformação.
Vem aí a sociedade dos 100 anos, não imagino chegar até lá, mas muitos de nós chegarão lúcidos, donos de suas vidas, quem sabe ainda independentes e muito ativos, carregando consigo a experiência de um mundo em constante transformação que poucos viram. Isto fará dos centenários uma referência a ser consultada e não desprezada pelos mais jovens. Assim esperamos.
Geraldo Nunes, jornalista, escritor e consultor literário, é titular da cadeira 27 da Academia Cristã de Letras - ACL