Na varanda da minha casa, repleta de flores e de perfumes, eu convidei alguns pássaros da fauna local, para participarem de um sarau musical sertanejo, bem ao gosto caboclo, e do qual eles seriam os protagonistas.
Confesso que, a princípio, eu estava um tanto descrente quanto à possível receptividade ao meu convite, pois, os pássaros são naturalmente ariscos aos gestos e atitudes dos humanos. E, não sem razão. Nós sabemos perfeitamente as suas motivantes: os seres humanos (nem todos, é claro) demonstram um prazer insano, diabólico mesmo, em prender, engaiolar pássaros, privando-os de sua liberdade natural, apenas para ouvir seus cantos entre quatro paredes.
Mas, para minha surpresa, logo eles foram se achegando e se empoleirando onde houvesse um apoio: na mureta da varanda, sobre as plantas dos vasos floridos que enfeitam o ambiente, bem como, nos galhos da romãzeira e no pé de mexerica, plantados defronte à varanda. Ali, bem em frente àquele cantinho que me dá tanto, tanto prazer, e onde, costumeiramente, ponho-me a sonhar a vida, enquanto canto e dedilho meu pinho companheiro, ao lado da cabocla-morena que motiva o meu sonhar. É que, ali mesmo, muitos deles constroem seus ninhos, sem serem importunados ou agredidos. Onde, com seus cantos silvestres e alaridos ressoam alegrias, dia a dia, festejando suas crias – novas vidas chegando para enfeitar e alegrar aquele meu recanto sagrado e feliz. E, de sobra, acrescem cores que se multiplicam e se misturam com graciosidade ímpar às cores das flores, numa harmonia somente explicada pela presença divina do Criador, o que me prende àquele lugar, como se fosse uma gaiola que me atasse à felicidade... ao paraíso, com sua porta aberta, da qual eu me recuso a sair, pois, sair dali, seria sim, abrir mão de minha própria liberdade.
Então, assim que tirei as primeiras notas no violão, e, como se obedecendo à batuta de um maestro, a magia explodiu no ar. Lançou-se ao encontro das bênçãos dos céus. Notas e acordes flutuavam pela suavidade da brisa vespertina que se fazia presente ali, contribuindo magistralmente com o cálido envolvimento do perfume trazido dos campos dos arredores.
Encantos e mais encantos ressoando vozes de sabiás, canarinhos, pintassilgos, rouxinóis, azulões, juritis, e de tantos outros. Reluzentes vozes se entrelaçando em chilreios campestres, num verdadeiro ritual de confraternização e tributo à generosa mãe natureza que nos acolhe.
Aí, aquela fraterna e contagiante harmonia estendeu-se ao limiar do crepúsculo, quando a excitação de momento, tão belo e especial, começou a arrefecer-se ante à presença, tímida ainda, da lua, anunciando a sagrada hora do descanso.
Assim, antes que o céu se fizesse estrelar, mas com a alma lavada, cada um daqueles mágicos e abençoados seres, e eu também, juntamente com minha doce companheira, buscamos o aconchego reparador no silêncio dos nossos ninhos, onde sonhamos com amanhãs preservados pela riqueza do amor, do respeito, da preservação da natureza, e da própria vida. Mesmo porque, o sentido da vida está no prazer com as coisas que à alma confortam de luz. E que, naquele meu canto, o canto tem luz, e até o silêncio reluz. Além do que, sob o pleno do sol e seu luzir que seduz, eu colho lições, sob as bênçãos do Pai. Por isso, este canto para ecoar solto aos céus, levando a harmonia nas asas libertas, florescidas de amor.