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Geraldo Nunes*

Durante anos apresentei um programa de rádio que recebia queixas e reclamações dos ouvintes. Dessa experiência cheguei à conclusão de que o povo gosta, e muito, de reclamar.

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Reclamam de tudo até de questões pessoais que não temos como resolver, por exemplo: o vizinho do apartamento ao lado que assiste televisão em volume alto até altas horas da noite e dificulta o sono de quem precisa acordar cedo no dia seguinte.

A solução precisa vir entre as partes, mas o reclamante entra em contato com a rádio para não se expor e por acreditar que pelos microfones resolveremos a questão.

Assuntos ligados ao sono são recorrentes entre os ouvintes; certa vez um cidadão morador de um bairro da periferia, entrou no ar pelo telefone e reclamou que um sabiá-laranjeira piava todas as madrugadas na sua janela, a partir das 3h30 e o acordava cedo demais. O que fazer?

Outra reclamação costumeira era, e ainda é, contra os feirantes que começam a montar suas barracas antes do nascer do sol, porque em São Paulo todos gostam de feiras livres, desde que aconteçam fora da rua onde moram.

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Sabe-se que as feiras ocupam o espaço público, impedem o trânsito e interditam as garagens, mas a vantagem de tê-las por perto também é grande, por causa das frutas e verduras sempre fresquinhas.

As feiras livres fazem parte do cotidiano da cidade, desde o século 18. Contam os historiadores que chacareiros provenientes da Penha, do Tatuapé, de Pinheiros e do Ó, levavam até o centro os seus produtos para serem vendidos.

Os feirantes daquele tempo se utilizavam somente de um tabuleiro sem cobertura que ficava exposto ao sol e à chuva.

Geralmente não era o dono da chácara quem vendia os produtos, mas sim um escravo idoso que já não produzia bem na lavoura.

Esse trazia consigo algum outro que perdeu parte da visão, ou por algum motivo ficou aleijado.

A mulher escrava doente também se tornava feirante, só que os lucros iam todos para o chacareiro.

As feiras livres do século 18 tinham outro nome; “quitanda”, por isso existe até hoje a Rua da Quitanda, no centro velho.

O Largo do Café também leva este nome por causa da comercialização deste produto. Por causa das feiras, é que surgiram na Pauliceia as ruas de comércio especializado.

Desde os tempos de Piratininga, os feirantes apregoam seus produtos fazendo algazarra, pisando na lama, lambuzando os pés e o chão.

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As feiras livres como conhecemos hoje foram institucionalizadas na cidade de São Paulo em 1914, por meio de um ato do prefeito Washington Luiz Pereira de Souza. A iniciativa veio em reconhecimento de algo que já ocorria informalmente na cidade.

A primeira feira livre oficial, realizada a título de experiência, contou com a presença de 26 feirantes e teve lugar no Largo General Osório e a segunda realizou-se no Largo do Arouche, com 116 feirantes. Houve depois a terceira, no Largo Morais de Barros.

Na atualidade, são cerca de 922 feiras livres realizadas em toda a cidade, de terça a domingo, no horário, conforme a legislação, entre 7h30 e 13horas.

A história paulistana e das feiras livres caminham juntas, embora todos saibam que feira livre boa, é aquela que acontece não na nossa rua, mas na rua dos outros.

*Geraldo Nunes, jornalista, escritor e radialista, ocupa a cadeira 27 da Academia Cristã de Letras