Reinaldo Bressani
Lembro-me bem daquele exato momento em que, pela primeira vez, eu a vi... só! ali, naquele canto do jardim.
Sua silhueta era simplesmente fulgurante. Naturalmente graciosa. Seus traços harmônicos ostentavam predicados indeléveis envoltos por uma intensa luz própria. Sua face rosada tinha a delicadeza do voo de uma gaivota. E tal beleza se realçava ainda mais pela viçosidade das flores da estação primaveril, que a emolduravam.
Porém, ela não sorria.
Chorava!
Chorava sua dor e seu pranto derramava.
Ora, num choro baixinho. Ora, num choro que desandava.
As lágrimas incontidas vertiam-lhe pela face. Num momento, aos cântaros, no queixume do sentimento de dor que, entre soluços, se avozeada. Noutro, simplesmente suas lágrimas gotejavam entre soluços e gemidos sôfregos. Era tristeza decorrente da perda de um ente querido. Duro golpe que lhe fora desferido pelo destino.
Sensíveis, as flores daquele jardim, não sei exatamente se em gesto comovido e solidário, ou se, simplesmente para tentar alegrá-la, refletiam, sob os raios do sol matinal, um sereno reluzir das gotas de orvalho sobre as pétalas aveludadas.
Só sei que, um desabrochar incessante sucedeu-se como nunca dantes.
Flores eclodiam às centenas. Todas em seu vigor pleno. Garbosamente, suas exuberâncias exibiam.
Levíssima brisa esvoaçava as folhas daquele verdeal, agitando os matizes das cores mil. Das minúsculas cravinas aos enormes girassóis; das delicadas caliandras às perfumadas angélicas; das alvas carissas às rubras sálvias splendens; das efêmeras ipomeias às eternas sempre vivas; das eclosivas cuspidárias às exóticas tumbergias; das ornamentais glicínias às cores mutantes das blunfelsias.
Enfim, todas, sem exceção, qual ave do paraíso em sua dança nupcial, tentavam distraí-la e demovê-la do seu pranto.
Também os pássaros gorjeavam alegres cantos em seus vôos soltos.
Até o colibri, em primorosas e acrobáticas danças se fazia presente.
A visão era tão mágica quanto comovente.
E eu, absorto, contemplativo, face àquela situação, fui notando as nuances que envolviam verdadeira celebração ao amor evidenciado pelo sentimento manifesto nas lágrimas pungentes daquela flor encantadora. Sublimado reconforto... tão sutil quanto à própria presença divina. Cores de afeto com brilho de amor.
Então, não obstante referida cena, de tão evidente tristeza em que estava envolta aquela delicada figura, naquele momento, por um capricho imperscrutável da alma, uma centelha tão incisiva quanto implacável, soprada por uma incógnita que a mente, por si só, não explica, aos meus olhos, e somente aos meus olhos, aquela mulher consternada, mostrou-se sublimada por induzentes fluidos que, de pronto, agitou meu peito, exposto e receptivo.
Em êxtase, embevecido e arrebatado, encantei-me como se cingido por blandícias balsâmicas.
E, enquanto experimentava o doce e irresistível sabor daquela celebração, eu me dava conta de que o amor, caprichosamente, como uma semente boa em terreno viçoso, brotava vigoroso em meu coração.
Sim! aquela figura soluçante e de meiguice envolvente, exposta e fragilizada em seus sentimentos, insidiosamente, embora de forma involuntária, fez brotar em mim, sentimentos que jamais eu havia experimentado.
Indescritível emoção apossou-se de mim. E o enlevo que me suavizava a alma, deixava evidente, a mim mesmo, a nobreza das intenções que brotavam em meu peito.
Meu Deus! estaria eu amando? pela primeira vez apaixonado, envolvido por uma paixão inimaginadamente fulminante?
Indagações de conclusão e respostas remansosamente positivas, pois as evidências eram transparentes e cristalinas.
Que bom! o que antes ignorava, passou a fazer parte de minh’alma.
Hoje, passado algum tempo, eu convivo com a suavidade desse sentimento crescendo mais e mais em meu peito.
Apenas, ela ainda não sabe, eu sei.
Por isso, também sofro apreensivo, angustiado, quanto ao desfecho.
Fico imaginando qual seria o melhor momento. A hora certa de lhe dizer do meu sentimento.
Por outro lado, também imagino a sua reação: sim, ou não!
É! tenho medo que ela diga não.
Mas como poderá ela evitar sentimento de tal grandeza?
Com poderá ela negar tamanha felicidade que me alardeia,
e todo este envolvimento inexplicável, plantado em meu peito de forma tão terna e bonita?
E se ela disser que sim? aceder ao coração e a magia do destino?
Tudo promete a intenção.
Promete um jardim garboso, com a mais intensa floração.