Lázaro Piunti
O Primo do meu irmão Arlindo, sujeito correto, tudo fazia para colocar na linha o seu parente desnaturado. O primo do Primo do meu irmão Arlindo, ao contrário do parente honesto, era o retrato do mau-caráter em pessoa.
Naquela época, estava pegando fogo uma ação religiosa na Espanha. Em Palma de Mayorca, inspirado por Eduardo Aguiló e solenemente oficializado por Dom Hervás nasceu o maravilhoso Movimento “Cursilho da Cristandade”.
A Boa Nova chegara aos países latinos como luz dos novos tempos.
O Primo do Arlindo, homem de fé, inscreveu o indigitado em um dos Encontros. Após os três dias de Clausura no Seminário de Campinas, o pecador voltou para casa. Iniciaria o famoso “Quarto Dia” restaurado. Depressa, o cristão novo procurou o pároco e se engajou nas atividades pastorais da Igreja. Logo nos primeiros meses se notou a sua transformação, para alegria geral. Ele ajudava na barraquinha do pastel nas festas de Santa Rita; carregava o andor nas procissões, transportava o velho pároco nas visitas aos enfermos e, se necessário, servia como Coroinha. Pau para toda obra. Nas Ultréyas, o homem dava testemunhos eloquentes, causando impacto e comovendo os irmãos. De Colores! Em julho o cansado sacerdote resolveu gozar merecidas férias e viajou para o Circuito das Águas acompanhado do Primo do Primo.
Hospedaram-se em uma Pousada Rural. Enquanto o reverendo meditava, lendo o breviário, a ovelha convertida se propôs transmitir a Palavra da Salvação às famílias nos sítios da vizinhança. Para vencer as distâncias, o dono da hospedaria emprestou uma bicicleta ao apóstolo do bem. E na primeira sexta-feira daquelas férias, o sujeito voltou da missão sem a bicicleta. “Não faça julgamento precipitado” – aconselhou o venerável sacerdote. “No domingo, na missa, haveremos de recuperar o objeto”.
Com efeito, durante o sermão, o celebrante convidou os fiéis a refletir sobre os Dez Mandamentos. Foi recitando um por um e, de propósito, demorou no 7º - “Não furtarás” – ciente de que entre os ouvintes o eventual ladrãozinho se acusaria. Ninguém reagiu. Mas, sorrateiramente, o primo do Primo fugiu da missa, saindo em desabalada carreira estrada afora.
Uma hora depois, voltou pedalando a Bicicleta. Apertado pelo reverendo, disse que contaria tudo, mas, no segredo da confissão. Assim se fez. E o malandro contou sem remorso: “Fiquei pensando nos Mandamentos e quando chegou ao 9º - “Não desejar a mulher do próximo” - me lembrei da casa da beata onde eu esqueci a Bicicleta”!