Slide
  • Fonte: Frances de Azevedo

Paulo Bomfim Porta-Retratos/Fotobiografia/90Anos, da jornalista Di Bonetti, 2ª. Edição, da sua própria Editora (Infoartes Editora), 2016, é trabalho que vale a pena ser visto, lido, analisado, pensado, gravado indelevelmente na memória, pelo seu valor cultural, artístico, estético e histórico! É obra de peso intrínseco e extrínseco, sendo este medido/sentido quando não só quando se o tem em mãos como quando se começa a folheá-lo. “Vale o quanto pesa”!

capa livro fotobiografia1 bd9c0Di Bonetti, para quem não sabe, era amiga de Paulo Bomfim, teve a feliz oportunidade de zelar por sua vida intelectual e estar bem próxima ao último Príncipe dos Poetas, em vários momentos de sua vida por mais de uma década.

Para esta obra, cuja dedicatória é feita: Ao poeta Paulo Bomfim, que me permitiu acompanhá-lo em seus “passeios da memória, a primeira imagem fotobiográfica é da mão direita do poeta apoiando-se em uma bengala. (...aparece também ínfima parte de seu corpo, da cintura para baixo...).

A sutileza dessa foto, da autora Di Bonetti, nos leva tão longe, mas tão longe, em nossas lembranças, em nosso imaginário, como se ela própria já nos revelasse a vida toda do historiado.

Se a autora iniciou pelo fim, não quer dizer que sua narrativa fotobiográfica seguirá por este caminho, porquanto é da Infância à mocidade, 1926 a 1943, que abre essas memórias, com foto do menininho Paulo com sua carriola...

Obviamente, que ao se falar desse menino, não se poderia deixar de citar, ou melhor, exibir as fotos de seus pais: Simeão Santos Bomfim e Maria de Lourdes Lébeis, que ficaram noivos e se casaram em 1925?!

A imagem de sua genitora, vestida de noiva, certamente, bem ao estilo dos anos vinte: vestido de corte reto, casquete com longo véu e pérolas, sentada, com suave sorriso, pés entrelaçados, numa postura de fina elegância. MAGNIFICA FOTO!

PauloBomfim, único filho do casal, nasceu: Paulo Lébeis Bomfim, em 30 de setembro de 1926, cujo respectivo registro se encontra na página 32.

Será mera coincidência ou proposital, eu me pergunto? Uma feliz coincidência, porquanto o mesmo viria a ser um dos Poetas da Revolução de 32, com seus célebres versos em redondilha maior, como Os Jovens de 32?!

As fotobiografias vão se sucedendo com suas tias Cecilia e Magdalena Lébeis avô materno Sebastião Lébeis, bisavô Carlos Batista Magalhães, primos, entre outros, e, ele, o protagonista, com um mês; aos dois meses; aos nove meses e um ano (1927) ... E, assim, vão narrando sua trajetória pela infância, mocidade e maturidade, sempre eivada de muito afeto pelos pais, parentes, empregados, amigos.

Casou-se com Emy Gelfi Bomfim e teve um filho: Raul Paulo Bomfim. Dois enteados: Dudu Santos e seu irmão Luis Norberto. Netos: Paulo Rudge Bomfim, Mirella Caiado Bomfim e Christina Scripelliti Santos e Bisneto: Victor Paulo.

Chama a atenção os bairros, prédios, jardins e outros locais da cidade de São Paulo, que viriam a compor, anos mais tarde, sua célebre obra Janeiros de Meu São Paulo, a qual tive o privilégio de receber do autor com a seguinte dedicatória: À Frances de Azevedo, minha irmã em Poesia. Contava ele, então, seus 80 anos de idade, tendo, Antônio Penteado Mendonça, nas suas “orelhas”, assim se referido a Paulo Bomfim: Agora Paulo Bomfim publica, quem sabe, o mais paulista de seus livros de textos. “Janeiros de Meu São Paulo” é a crônica da entrega consciente do homem em holocausto a tudo que ele ama: sua terra, seus amores, sua musa, seus descendentes, seus amigos.

Seu amor por São Paulo, incluindo as Arcadas (Faculdade de Direito do Largo São Francisco) fazia parte do seu universo, - era incontroverso – e, em seus versos e prosa foi contado e cantado, como nestas trovas: O território que eu amo/ É o coração da cidade/ É livre como a esperança/ É bom como a mocidade. // Memórias de São Francisco/Que eu canto com emoção/ Em cada canto do Largo/ Eu largo meu coração. //

Depois da família, os amigos são lembrados certamente e vão desfilando indefinidamente, porquanto o Poeta era pródigo em fazer e manter amizades desde tenra infância, sempre com seu indefectível sorriso, polidez, majestade e simplicidade de sua postura.

Dentre seus inúmeros amigos, encontro alguns que são meus Confrades na Academia Cristã de Letras, como Paulo Nathanael Pereira de Souza: Cadeira 01, José Renato Nalini: Cadeira 08, Raul Marino Júnior: Cadeira 05, Ives Gandra da Silva Martins: Cadeira 23, Di Bonetti: Cadeira 24 ...

Das inúmeras entidades das quais fazia parte ou pelas quais, um dia, passou, participou, também são mencionadas nessa Fotobiografia, como a Academia Paulista de Letras, cuja posse na Cadeira 35 foi em 23 de Maio de 1963, tendo sito saudado por Ibrahim Nobre.

E, novamente, eis, aqui, mais uma vez, outro dado alusivo à Revolução de 32, pois foi em 23 de Maio de 1932 o início dos conflitos da Revolução Constitucionalista de 32, onde tombaram quatro jovens: Martins, Miragaia, Dráuzio e Camargo!

Nem só de fotografias foi edificada essa obra, com 319 páginas, porquanto a poesia de Paulo Bomfim há se quer expressa com palavras, como as bem- colocadas metáforas em Antônio Triste (Fls. 301/302), dentre outras (Fls. 303/313) e que foram musicadas por Eduardo Santhana (Fls. 314). Tanto que, às fls. 147/149, José Renato Nalini (Cadeira 8, da Academia Cristã de Letras), assim se referiu a ele: Paulo Bomfim: a fidalguia poética, de cujo artigo destaco: Só quando me mudei para São Paulo tive a ventura de privar do convívio bomfiniano, com algum pudor inicial, pois estava diante do “Príncipe dos Poetas Brasileiros”, sucessor de Guilherme de Almeida, amigo de todos os grandes intelectuais do Brasil e do mundo.

Certamente, há muito, mas muito mais, para dizer sobre essa histórica obra, porém, quedo-me silente - não sem antes transcrever o poema Antônio Triste - para que o leitor, com esse gostinho de “quero mais”, vá logo ao encontro desta e faça como eu: saboreie cada foto, cada página, cada lembrança ...Frances de Azevedo 1 25820

Esguio feito um poste na Avenida
Cheios de fios e de pensamentos,
Antônio era triste como as árvores
Despidas pelo inverno,
Alegre, às vezes, quase passarada
Nos fins da madrugada.

Sozinho, irmão dos bancos de uma praça
Em noites de neblina,
Antônio, protegido de retalhos
Com seu cigarro aceso,
Lembrava-me um balão que, multicor,
Se vê no firmamento:
Não se sabe donde veio
Não se sabe aonde vai,
Não era velho
Não era moço,
Não tinha idade
Antônio Triste.

Quando as luzes cansadas se apagavam
E as trevas devoravam a cidade,
Antônio Triste chorava e cantava:
À luz de um cigarro, bailava e rodava
Pelas ruas desertas e molhadas.

Mas, certa noite um varredor de rua,
Viu muito lixo no chão:
Tanto trapo amontoado,
Quase um balão de São João!

Um resto de cigarro num canto da boca,
A mecha se apagara.
Antônio, o triste balão de retalhos,
Findara!

 

Frances de Azevedo - Cadeira 39 da ACL - (Junho/2021)