Meu confrade Kyoshi Hashimoto, Diretor Vice Superintendente da Distrital Centro da ACSP e membro do COCCID- Comitê Cívico e Cultural da ACSP, do qual tenho a honra de ser Secretária, publicou no Grupo, o seguinte texto:
Como era o comportamento dos japoneses quando chegaram ao Brasil em 1908; segue o depoimento de um inspetor de imigrantes do Estado de São Paulo:
Contrariando as expectativas negativas de como efetivamente eram os japoneses, J. Amândio Sobral, inspetor de imigrantes do Estado de São Paulo, redigiu um extenso artigo publicado no jornal Correio Paulistano de 26 de junho de 1908, descrevendo suas impressões sobre os imigrantes nipônicos. Sob efeito deste primeiro impacto, em seu texto, Sobral expressa abertamente que os elogios que faz ao comportamento e à aparência dos japoneses não eram um exagero de sua parte, relatando que o grau de limpeza de “gente de humilde camada social do Japão” era qualificado como “inexcedível”, e que “houve em Santos quem afirmasse que o navio japonês apresentava em sua 3ª classe mais asseio e limpeza que qualquer transatlântico europeu de 1ª classe”. Ao deixarem o trem que os trouxe de Santos à hospedaria de imigrantes em São Paulo, ele observou que “saíram todos dos vagões na maior ordem e, depois de deixarem estes, não se viu no pavimento um só cuspo, uma casca de fruta”. Na hospedaria, os japoneses “têm feito as suas refeições sempre na melhor ordem e, apesar de os últimos a fazerem duas horas depois dos primeiros, sem um grito de gaiatice, um sinal de impaciência ou uma voz de protesto” (…) “surpreendeu a todos o estado de limpeza em que ficou o salão: nem uma ponta de cigarro, nem um cuspo, perfeito contraste com as cuspideiras e pontas de cigarro esmagadas com os pés de outros imigrantes”.
Muitos chegaram com pequenas bandeiras do Brasil e do Japão feitas de seda nas mãos, “trazidas de propósito para nos serem amáveis. Delicadeza fina, reveladora de uma educação apreciável”, observou Sobral. E todos se vestiam de modo simples, mas à ocidental – o que na época foi algo inesperado. “A vestimenta europeia conquista terreno no império do Sol Nascente. Foram os próprios imigrantes que compraram as suas roupas, adquiridas com seu dinheiro, e só trouxeram roupa limpa, nova, causando uma impressão agradável”.
Dois aspectos que chamaram a atenção de Sobral são curiosos. Ele observou que a bagagem dos japoneses “não parece bagagem de gente pobre, contrastando flagrantemente com os baús de folha e trouxas dos nossos operários”. Os japoneses eram imigrantes pobres, mas agiam com dignidade e educação. Trouxeram malas de vime, roupas e objetos simples, mas limpos ou novos. Pela descrição da bagagem no relatório, verifica-se que todos tinham poucas, mas mesmas coisas: escova e pó dental, pente e navalha de barba (itens de higiene pessoal que na época muitos imigrantes europeus e até mesmo brasileiros não tinham); futons, makuras (travesseiros) de madeira e casacos (artigos têxteis caros para imigrantes); pequenas ferramentas, utensílios de cozinha e frasquinhos para shoyu. A maioria trouxe livros, tinta e papel (coisas que eram consideradas um “luxo” para trabalhadores braçais). De 781 pessoas, verificou-se que menos de 100, ou cerca de 13% delas, eram analfabetas – um baixo índice de analfabetismo na época. Estes eram os objetos que os japoneses, mesmo sendo pobres, se esforçaram para comprar e trazer do Japão, e que consideravam indispensáveis para começar uma vida longe da terra natal.
Outro foi o grau de confiança que os japoneses tinham em suas mulheres, “a ponto de, para não interromperem uma lição adventícia de português, lhes confiarem a troca de seu dinheiro japonês em moeda portuguesa”. Na época, os homens no ocidente não confiavam em suas esposas para lidar com assuntos relacionados a dinheiro, mas as japonesas faziam câmbio para seus maridos. Os imigrantes japoneses eram pobres, mas não eram miseráveis.
Sobral terminou seu longo relatório observando que “os empregados da alfândega declaram que nunca viram gente que tenha, com tanta ordem e com tanta calma, assistido à conferência de suas bagagens, e nem uma só vez foram apanhados em mentira. Se esta gente, que é todo trabalho, for neste o que é no asseio, (nunca veio pela imigração gente tão asseada), na ordem e na docilidade, a riqueza paulista terá no japonês um elemento de produção que nada deixará a desejar. A raça é muito diferente, mas não inferior. Não façamos, antes do tempo, juízos temerários a respeito da ação do japonês no trabalho nacional”. Este foi o testemunho de um brasileiro que, tanto como outros, jamais havia lidado um japonês, mas que por força da profissão foi o primeiro a conviver com os imigrantes pioneiros durante semanas.
Segundo Kyoshi, este texto foi publicado no Uchinanchus do Brasil
https://www.facebook.com/groups/290035564417702/permalink/3882297848524771/
(Uchinanchus: Palavra do dialeto de Okinawa, que significa o nascido lá, ou é descendente da civilização Kyukyu).
Okinawa é uma prefeitura Japonesa formada por mais de 150 ilhas no mar da China Oriental entre Taiwan e Japão continental. Ela é conhecida por seu clima tropical, pelas praias amplas e pelos recifes de corais, bem como pelos locais da Segunda Guerra Mundial e na maior ilha (também chamada de Okinawa) está o Museu do Memorial da Paz de Okinawa, que relembra a invasão dos Aliados em 1945, e o aquário Churaumi, onde estão tubarões-baleia e jamantas. (Google).
Kyukyu: é o nome de um arquipélago pertencente ao Japão, situado na mesma ilha de Okinawa. Seu nome em japonês é: Nansei-chatô.
Tal relato não me passou despercebido, nem poderia, pois eivado de edificantes exemplos de cidadania, de valores éticos, culturais...
“Delicadeza fina, reveladora de uma educação apreciável”, como bem observou J. Amândio Sobral: Inspetor da Secretária de Agricultura, órgão responsável pela imigração no Estado de São Paulo.
A chegada desses exemplares imigrantes ocorreu em 18 de Junho de 1908, no Navio Kasato Maru, mesmo ano das observações de Sobral, - publicadas no Jornal Correio Paulistano-.
Indubitavelmente, eis aqui, bons ensinamentos, os quais, devemos seguir, como preleciona meu Confrade/Padrinho J. B. Oliveira, Cadeira 28, da Academia Cristã de Letras:
“Os maus se juntam e cometem toda espécie de males. É tempo de unir os bons para prática conjunta do BEM”.
Frances de Azevedo - Cadeira 39 da ACL