Os cristãos chamam de quaresma o período de 40 dias que vai da quarta-feira de cinzas até o domingo de páscoa.A palavra vem do latim e traduzida em sua forma literal significa, “quadragésima”.
Estamos ouvindo muito no Brasil atual a palavra quarentena, por causa da pandemia, mas esta não significa necessariamente 40 dias de isolamento para a covid-19.Antigamente, quando se suspeitava da existência de alguma doença entre passageiros ou tripulantes de um navio, esse ficava retido 40 dias ao largo do porto, sem atracar.
Diz a religião católica que todos os pecados praticados, inclusive durante o carnaval, podem ser compensados na quaresma, se houver algum tipo de sacrifício, também chamado de penitência ou mortificação. Existem pessoas que ainda guardam o costume de não comer carne nas sextas-feiras durante a quaresma, este é um tipo de penitência.
No passado as tradições eram mais rígidas e algumas, é bem verdade, exageradas; a ponto de se tornarem chatas. Se alguém lembrasse de uma música de sucesso no carnaval e saísse cantarolando nas ruas ou mesmo dentro de casa, durante a quaresma, cometia pecado. Em algumas residências se ralhava com quem ficasse se admirando diante do espelho neste período.
As moças que usavam maquiagem ou perfumes em demasia eram chamadas à atenção, por serem sinais de vaidade. Deste modo; namorar, dançar, assobiar, ou demonstrar alegria na quinta ou sexta-feira da paixão, se constituía em falta de respeito a Jesus por ele ter passado esses dois dias em profundo sofrimento.
Algumas crendices sobrevivem
Em Joanópolis, cidade do interior paulista, alguns moradores ainda dizem que uma mula sem cabeça ronda a cidade durante a quaresma, na vizinha Piracaia, certa vez entrevistei senhoras que moram lá me garantiram terem visto um lobisomem que sempre aparecia em um matagal próximo das residências às sexta-feiras perto da meia-noite.
Mesmo em São José dos Campos, cidade industrializada e populosa, um grupo de pessoas conhecido como “Louvadores de Almas”, seguem a tradição religiosa de bater de casa em casa durante as sextas-feiras da quaresma para rezar com as famílias.
Em Petrolina, estado de Pernambuco, ainda ocorre algo horripilante: Pessoas que se sentem pecadoras, praticam durante a quaresma o autoflagelo, ou seja, ficam se batendo com um chicotinho.
Todos os anos, durante a primeira hora da quinta-feira da paixão, alguns séculos de história percorrem as ruas da cidade de Goiás, antiga capital do estado, onde nasceu a poetisa Cora Coralina. Pessoas vestidas de branco, encapuzadas, saem carregando tochas até a igreja de Nossa Senhora da Boa Morte onde uma multidão as aguarda. Este ritual conhecido como Fogaréu de Goiás, traz consigo uma tradição ibérica do século 17.
Não tem nada a ver, mas a roupagem é assustadora, faz lembrar a Ku Klux Klan, organização de extrema-direita dos Estados Unidos que defende a supremacia branca e pratica uma espécie daquilo que podemos chamar de nacionalismo exacerbado.
A tradição seguida pelos goianos, é meramente cristã e chegou ao Brasil inspirada nas procissões realizadas em Lisboa, Sevilha e Toledo, todas quintas-feiras santas, mas na Europa a cerimônia se dava durante o dia, antes da cerimônia do lava-pés. Tal procissão na cidade de Goiás, começou em 1745, trazida pelo padre português Perestrello Espíndola.
Algumas dessas proibições citadas durante a quaresma, remontam um passado recente vivido no século 20 e ao nosso ver foram abolidas, pois se tratava de uma verdadeira chatice. Por exemplo, ninguém podia ligar aparelhos de rádio ou televisão na sexta-feira santa.Mesmo as emissoras, nessas datas religiosas, costumavam mudar sua programação para levar ao ar o dia todo, programas religiosos ou de músicas sacras.
Esses sacrifícios terminavam no sábado de aleluia, dia da malhação de Judas, brincadeira considerada ofensiva e de mau gosto. O mais importante é que depois quaresma, vem a Páscoa! Graças a Deus!