Quero retornar ao meu passado...
Pois, lá, tenho minha família por inteiro,
Tenho abraços, almoço e jantar,
Com todos à volta da mesa,
Conjugando o verbo amar...
Quero retornar ao meu passado...
Onde as estações do ano seguiam,
Cada uma, seu ciclo e não se misturavam:
A Primavera, ao acordar,
Derramava-se em flores de esperança;
O Verão intenso convidava a passear;
O Outono era pura poesia e
O Inverno não tinha o tal de veranico...
Quero retornar ao meu passado...
Onde as CARTAS circulavam:
Prenhes de noticias tão esperadas;
E ESCREVER era forma simpática,
Humana e comum de se dizer:
Saudade. Eu lhe amo. Volta logo...
Havia diálogo falado e escrito;
A voz era ouvida, escutada:
Linguagem humana apreciada.
Os gestos, o olhar, importavam,
Eram imprescindíveis...
Quero retornar ao meu passado...
Pois, hoje, as “figurinhas”
Ditam as regras, ocupam espaço das letras
Para transmitir sentimentos.
É uma avalanche enorme
Que sequer dá chance pra Pensar,
Refletir, Raciocinar, Dialogar...
Aliás, esses verbos foram suprimidos,
Voltamos à Era das Cavernas,
Retrocedemos no aprendizado...
Quero retornar ao meu passado...
Onde o humanismo se fazia presente
No ir e vir de toda gente e em nossa mente.
Nos aniversários havia bolo de verdade,
Pessoas! Sim Pessoas, Gente!
Presentes embrulhados com fitas,
Com cartões afetivos escritos à mão,
Sorrisos nas chegadas e nas partidas,
Apertos de mãos e acenos reais...
Quero retornar ao meu passado...
Pois, apesar de ainda escrever, poetar,
Recebo de volta uma “figurinha”
Escolhida ao acaso, a esmo,
Num gesto mecânico, onde basta
Clicar com o dedo para escolher
Uma resposta, que lá está prontinha.
Esse vocabulário é extenso, inimaginável,
Criativo, absurdo, devastador;
Estraçalhou com a nossa língua
Fazendo Olavo Bilac revirar-se no túmulo,
Pois se esqueceram da Última flor do Lácio
Inculta e bela...
Quero retornar ao meu passado,
Eu quero, de verdade...