No dia 9 de agosto de 2018, o Acadêmico Helio Begliomini, que ocupa a Cadeira nº 10 da Academia Cristã de Letras, tomou posse na Academia Paulista de História, e ocupa, a partir dessa data, a Cadeira de nº 34, onde o Patrono é Jaime Cortesão e seu antecessor Manuel Nunes Dias.
A sessão solene foi aberta pelo membro da Academia Cristã de Letras, atual Presidente da APH, Luiz Gonzaga Betelli e a saudação foi proferida pelo Acadêmico Paulo Nathanael Pereira de Souza que ocupa a Cadeira de nº 8 na APH e a Cadeira nº 1 na Academia Cristã de Letras.
Após a leitura do termo de posse e assinatura, Helio recebeu das mãos do confrade nas duas Academias, APH e ACL, Guido Palomba, o colar de Acadêmico e das mãos do confrade também nas duas Academias, Douglas Michalan, o diploma de Acadêmico.
A posse aconteceu no Auditório Olavo Setubal, com endereço na Rua Tabapuã nº 469 - Itaim Bibi - SP.
Após as fotografias que seguem, o discurso de posse na íntegra:
Discurso de posse de Helio Begliomini na íntegra:
Um Médico Entre Historiadores – Agradecendo a um Especial Convite de Clio[1] e [2]
Saudação
Ilustríssimo acadêmico, doutor Luiz Gonzaga Bertelli, mui digno presidente da Academia Paulista de História.
Ilustríssimo acadêmico, professor Paulo Nathanael Pereira de Souza, titular da cadeira no 8, que amavelmente me saudou.
Ilustríssima acadêmica, professora doutora Ebe Reale, titular da cadeira no 40.
Ilustríssimo professor doutor José Eduardo Marques Mauro, recipiendário da cadeira no 36.
Ilustríssimo acadêmico Douglas Michalany, ex-presidente e titular da cadeira no 13, em seu nome saúdo os membros da Academia Paulista de História.
Ilustríssima acadêmica, escritora Rosa Maria Custódio, em seu nome saúdo meus confrades e confreiras da Academia Cristã de Letras.
Ilustríssimo acadêmico, professor doutor José Roberto de Souza Baratella, presidente da Academia de Medicina de São Paulo, em seu nome saúdo meus confrades e confreiras dessa vetusta instituição.
Ilustríssimo amigo Salvatore Dell’Aquila, em seu nome saúdo meus companheiros do Rotary International.
Ilustríssimo confrade, doutor Francisco Ferraz Luz, em seu nome saúdo meus confrades e confreiras da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores.
Saúdo também meus diletos amigos e amigas, voluntários do ambulatório da Paróquia Nossa Senhora de Fátima do Jardim Tremembé.
Saúdo meus velhos e inesquecíveis amigos e amigas de adolescência e juventude.
Saúdo meus queridos familiares, esposa e filho, assim como a todos os presentes.
Introdução
Ainda ressoa nitidamente em meu ouvido e mente as auspiciosas mensagens que recebi por telefone, no final de fevereiro passado, de dois ilustres membros desta ínclita Academia Paulista de História. Refiro-me aos acadêmicos: Luiz Gonzaga Bertelli, estimado presidente deste sodalício, acrisolado patriota e incansável defensor da cultura e das letras, titular da cadeira no 21 sob a patronímica do sacerdote e historiador Rafael Maria Galante (1840-1917); assim como a Douglas Michalany, respeitado e querido presidente emérito, titular da cadeira no 13 sob a patronímica do jornalista e historiador José Francisco da Rocha Pombo (1857-1933). Cada qual, a seu modo e com inesquecível entonação, me disse: “Você foi eleito membro titular da cadeira no 34 da Academia Paulista de História!!!
Certamente vibrei e continuo vibrando com essa bendita notícia! Não há nenhuma pessoa que se dedique com denodo e afinco à sua profissão, ao seu trabalho ou ao seu passatempo, que não deseja ser reconhecida pelos seus pares.
Assim, ser aceito a ombrear com uma plêiade de intelectuais como os membros que compõem esta egrégia casa de cultura e do saber, que tem como paradigmas: um número restrito de cadeiras, assim como a vitaliciedade de seus membros – postulados oriundos da antiquíssima Académie Française, fundada em 1635 pelo cardeal Richelieu[3] –, é um feliz e honrado galardão reservado a pouquíssimos! E essa é a exata medida da minha inefável alegria e profunda gratidão, estejam certos disso!
Origem do Sodalício
A Academia Paulista de História completará, neste ano, o seu 46a aniversário de profícua existência. Fundada em 18 de dezembro de 1972 por membros do vetusto Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo[4], tem bem cumprido sua missão de estudar, enaltecer e divulgar aspectos da história paulista, brasileira e mundial. Dentre seus fundadores encontram-se renomados historiadores como Antônio Barreto do Amaral, Tito Lívio Ferreira (1894-1988), Álvaro da Veiga Coimbra (1886-1976), Pedro Brasil Bandecchi (1917-1997), Célio Salomão Debes (1926-) e Aureliano Leite (1886-1976).
A idealização do desenho da insígnia da Academia Paulista de História é obra do membro fundador Álvaro da Veiga Coimbra, igualmente renomado numismata e medalhista[5] (Figuras 1 a 3).
Figuras 1 a 3 – Álvaro da Veiga Coimbra; símbolo e medalha da Academia Paulista de História.
Entre os patronos das 40 cadeiras que compõem esta honorável grei encontram-se intelectuais e historiadores de escol, tais como: Afonso d’Escragnolle Taunay (1876-1958), Alexandre de Gusmão (1695-1753), Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha (1866-1909), Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878) ou Visconde de Porto Seguro; Francisco José de Oliveira Viana (1883-1951), José de Alcântara Machado de Oliveira (1875-1941), José Maria da Silva Paranhos Júnior (1845-1912), mais conhecido por Barão do Rio Branco; Júlio César Ferreira de Mesquita Filho (1892-1969), Pedro Taques de Almeida Paes Leme (1714-1777), padre Serafim Soares Leite (1890-1969) e Frei Vicente do Salvador (1564-1636)[6] dentre outros.
Por sua vez, os poucos e notáveis membros que foram admitidos neste silogeu em quase meio século de história consagraram-se em suas atividades e produções intelectuais, sendo reconhecidos e igualmente pertencendo a outras insignes e renomadas confrarias de misteres diversos, mas congêneres na essência, tais como: Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, Academia Brasileira de Letras, Academia Brasileira de Filosofia, Academia Paulista de Letras, Academia Cristã de Letras, Academia Paulista de Letras Jurídicas, Academia de Medicina de São Paulo, Academia Paulista de Educação, Academia Campinense de Letras, Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Sorocaba, dentre outras.
Aprendi a conhecer e a admirar a Academia Paulista de História há quase quatro lustros, precisamente na segunda das três gestões do estimado acadêmico Douglas Michalany[7], hoje presidente emérito. Michalany deu nova versão ao Boletim da Academia Paulista de História (Figuras 4 a 7), iniciado em 9 de julho de 1989 por Duílio Crispim Farina. Anos depois, na gestão do ilustre acadêmico Luiz Gonzaga Bertelli[8], o boletim deu lugar à substanciosa Revista da Academia Paulista de História, depois denominada por Revista do Historiador (Figuras 8 e 9). Ademais, o sodalício tem promovido diversos cursos sobre a História de São Paulo, fóruns conjuntamente com outros silogeus, além do Prêmio Literário José Celestino Bourroul, concedido anualmente ao melhor livro publicado sobre a história de São Paulo.
Figuras 4 a 7 – Exemplares do Boletim da Academia Paulista de História do segundo e terceiro mandatos da presidência de Douglas Michalany, respectivamente: no 61 (junho/1999); no 62 (julho/1999); no 111 (outubro/2003); e no 113 (dezembro/2003).
Figuras 8 e 9 – Exemplares da Revista da Academia Paulista de História – Revista do Historiador, iniciada na gestão de Luiz Gonzaga Bertelli, respectivamente: no 119 (novembro-dezembro/2004) e no 193 (novembro-dezembro/2017).
Um Estranho no Ninho!?
Mediante tão restrita e seleta confraria que me elegeu, cheguei, alegoricamente, a bater diversas vezes no meu rosto – obnubilado pelo resultado do ditoso escrutínio! – na tentativa de fazer-me acordar de um belo sonho e a me perguntar? O que estaria fazendo eu, um modesto filho de Hipócrates (460 a.C. – 370 a.C.), entre tão eminentes intelectuais e historiadores!?
À primeira vista, tive a natural sensação de ser realmente um estranho no ninho! Contudo, refletindo morosamente e tentando convencer-me da benfazeja realidade, tal qual um belíssimo devaneio, depreendi três momentos significativos em minha vida que, julgo, terem contribuído para este desiderato. Assim, como preito de reconhecimento, ao recordá-los expresso meu dileto agradecimento. Afinal, agradecer é, por vezes, reconhecer o outro melhor do que a si próprio em alguns ou em muitos aspectos.
Primeiro Momento – Formação Universitária
Tive uma formação universitária privilegiada, que não somente me proporcionou substanciosos conhecimentos técnicos, mas também humanísticos explícitos e implícitos, a favor da vida humana, do estudo, da pesquisa, da assistência fraterna ao enfermo; do conhecimento e da cultura.
Torna-se mister destacar dentre os inolvidáveis lentes que tive, a figura condestável de Carlos da Silva Lacaz (1915-2002, Figuras 10 a 13), renomado cientista, professor, escritor, biógrafo e historiador, dentre tantos predicados que teve em sua profícua existência.
Figuras 10 a 13 – Carlos da Silva Lacaz em quatro momentos de sua vida.
Lacaz combatia com veemência a iconoclastia reinante numa época em que as pessoas e a própria sociedade ainda não eram tão descartáveis como hodiernamente. Suas preleções eram recheadas de dados e fatos da história da medicina, assim como de memoráveis ícones que a ela se dedicaram – os heróis da arte de curar! –, prendendo a atenção de todos. Além de inúmeros artigos que escreveu, deixou muitos livros científicos e também de historiografia médica. Plutarco, escreveu, resgatou e perenizou dezenas e dezenas e dezenas de biografias de médicos exemplares, jungidas em quatro volumes que intitulou Vultos da Medicina Brasileira (1953, 1961, 1966 e 1977).
Lacaz era um orador elegante, vibrante, persuasivo e contumaz. Em 40 anos de exercício profissional e outros seis de vida universitária, eu jamais vi alguém que, como ele, defendesse com amor e ardor o médico e a medicina como profissão sacerdotal! Lacaz foi um precioso paradigma em minha formação! Tributo a ele minha preocupação e interesse com a história de entidades e seus protagonistas.
Dentre tantos aforismos que deixou, por oportuno, cito: “Se nem todos podem ser gênios, todos podem ser úteis”. Tendo a certeza de não possuir traços da genialidade, procurei pautar minha a vida sendo simples e despretensiosamente útil ao próximo e às entidades as quais participo.
Segundo Momento – Sobrames
Oito anos após a minha graduação, precisamente em 1986, ingressei na Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – Sobrames (Figuras 14 e 15), entidade que muito me estimulou e desenvolveu nos caminhos da literatura não científica. Deu-me, igualmente, abertura e incentivo para pesquisar e produzir ensaios e trabalhos sobre historiografia, além de conhecer grandes médicos escritores “anônimos”, quero dizer – não midiáticos, desconhecidos do grande público – que, se já não ocupam cadeiras nos mais diversos silogeus dispersos por este país, bem o mereceriam. Curiosamente, anos depois do meu ingresso na Sobrames, fiquei sabendo que meu inesquecível professor Carlos da Silva Lacaz houvera sido o terceiro presidente dessa fraterna entidade!
Figuras 14 e 15 – Símbolos da Sobrames nacional, à esquerda; e da Sobrames – Regional do Estado de São Paulo, à direita.
Terceiro Momento – Academia Cristã de Letras
Não tenho dúvida alguma de que meu ingresso, em 23 de março de 2000, como segundo ocupante da cadeira no 10 da querida e singular Academia Cristã de Letras[9] alavancou minha trajetória como escritor. Nela fui conduzido pelo saudoso professor Afiz Sadi (1924-2010, Figuras 16 e 17), que pontificou durante 30 anos! (1964-1994) como titular da disciplina de urologia da Escola Paulista de Medicina, hoje, Universidade Federal de São Paulo (EPM – Unifesp). Em seu serviço tive o privilégio de realizar entre 1982-1984 minha pós-graduação, depois de concluídos três anos de minha residência médica. Foram também tempos inesquecíveis!
Figuras 16 e 17 – À esquerda, símbolo Academia Cristã de Letras, e, à direita, Afiz Sadi.
Afiz Sadi foi um homem de grande cultura e memória prodigiosa, assim como de acurada lucidez, mesmo em idade provecta. Além de ter publicado diversos livros científicos, deixou ensaios, trabalhos de historiografia, além de poesias. Ele houvera ocupado a presidência da Academia Cristã de Letras por dois mandatos (1988-1989 e 1990-1991). Curiosamente, tive, 21 anos após, a honra de sucedê-lo (1976-1977) por três vezes, na presidência da Comissão de Ética Médica e Defesa Profissional da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU)[10] – sede nacional.
A pertença na Academia Cristã de Letras deu-me a extraordinária felicidade de conhecer e de conviver com outros notáveis intelectuais não médicos e das mais diversas atividades – verdadeiros titãs da cultura, do saber e do patriotismo –, bem como também lhes facultou me conhecer através de trabalhos não científicos.
“A gratidão é a memória do coração”, sintetizou Antístenes (445 a.C – 365 a.C), filósofo ateniense. Dessa forma, reconhecendo, agradecendo e enaltecendo esses estimados professores e entidades, dentre tantos outros ilustres membros que nelas conheci, despojo-me de quaisquer ranços de vanglória, tributando muito a eles os méritos deste inestimável laurel, que ora gentilmente recebo.
Genealogia da Cadeira no 34
A inapreciável alegria a mim conferida de pertencer a Academia Paulista de História deu-me, involuntariamente, um denominador comum com Jaime Cortesão, patrono da cadeira no 34, a que terei a honra de ocupar. Ele, assim como eu, foi médico, mas também se destacou como político, escritor e historiador.
Patrono
Jaime Zuzarte Cortesão (Figura 18), mais conhecido simplesmente por Jaime Cortesão, nasceu 29 de abril de 1884, em Ançã, uma pequena vila portuguesa pertencente à Catanhede, cidade do distrito de Coimbra. Oriundo de família ilustre, seu pai, Antônio Augusto Cortesão (1854-1927) foi filólogo; seu irmão foi o engenheiro e historiador Armando Frederico Zuzarte Cortesão (1891-1977); por sua vez teve como filhas Maria Judith Zuzarte Cortesão (1914-2007), renomada ecologista, e Maria da Saudade Cortesão (2013-2010), poetisa, que esposaria Murilo Monteiro Mendes (1901-1975), poeta modernista e expoente do surrealismo brasileiro.
Figura 18 – Jaime Zuzarte Cortesão (1884-1960).
Jaime Cortesão graduou-se em 1909, na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Lecionou no Porto (1911-1915), ocasião em que foi eleito deputado por essa cidade. Defendeu a participação de Portugal na I Guerra Mundial, tendo atuado como voluntário, no posto de capitão médico do Corpo Expedicionário Português, experiência que o inspirou a publicar o livro Memórias da Grande Guerra – 1916-1919 (Porto, 1919).
Juntamente com outros intelectuais foi cofundador das revistas: Nova Silva (1907), A Águia (1910) e Seara Nova (1921), assim como atuou no movimento cultural português iniciado em 1912, chamado Renascença Portuguesa, que publicava um boletim intitulado A Vida Portuguesa. Outrossim, colaborou nas revistas Atlântida, Ilustração, Ilustração Portuguesa e Serões.
Em 1919 foi nomeado diretor da Biblioteca Nacional de Portugal, ano em que também se tornou oficial da Ordem Militar de Santiago da Espanha. Presidiu a Junta Revolucionária estabelecida no Porto, que tentou derrubar, debalde, a ditadura militar vigente. Por esse episódio foi demitido, em 1927, do cargo de diretor da Biblioteca Nacional, vindo a se exilar na França, de onde saiu em 1940, em decorrência da invasão do exercito nazista, na II Guerra Mundial.
Através de Portugal veio ao Brasil, ficando detido por um curto espaço de tempo. Radicado no Rio de Janeiro dedicou-se ao ensino universitário, especializando-se na história dos Descobrimentos Portugueses, que resultou na publicação de obra homônima em dois volumes (Lisboa, 1960 e 1962), assim como na formação territorial do Brasil.
Em 1952, em preparação à comemoração do 4o Centenário da Fundação da Cidade, organizou a Exposição Histórica de São Paulo.
Jaime Cortesão regressou a Portugal em 1957. Contudo, novamente por envolvimento político, ficou preso por quatro dias em 1958, ano em que também foi eleito presidente da Sociedade Portuguesa de Escritores. Faleceu em Lisboa, aos 76 anos, em 14 de agosto de 1960.
Recebeu os seguintes títulos póstumos: Grande Oficial da Ordem da Liberdade (1980) e Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique (1987).
Polígrafo, Jaime Cortesão deixou além de obras de historiografia, diversos ensaios, contos, poesias, dramas, romances e cartas.
Fundador
Diferentemente do patrono da cadeira no 34, seu fundador Manuel Nunes Dias (Figura 19), nascido em 1921, foi um historiador acadêmico, de carreira.
Bacharelado e licenciado em geografia e história atuou como professor concursado do magistério do Estado. Graduado também em jornalismo pela Escola Cásper Líbero, foi diretor do jornal Tribuna da Imprensa, da sucursal de São Paulo, ao mesmo tempo em que respondeu na Escola de Jornalismo, pela disciplina de história contemporânea das relações internacionais.
Figura 19 – Manuel Nunes Dias.
No início dos anos de 1950, a convite, tornou-se assistente do professor Eduardo D’Oliveira França, na cadeira de história moderna e contemporânea da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo. Nessa condição encontrou trampolim para sua carreira universitária: obteve o grau de doutor em história moderna e contemporânea; duas livres-docências, respectivamente em história moderna e contemporânea, e em história da América; galgando, por fim, a cátedra em história da América com tese sobre “El Real Consulado de Caracas – 1793-1810”.
No término da década de 1970, convidado pelo reitor da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Unesp, tornou-se administrador do campus de Franca. Destacou-se no incentivo à criação da pós-graduação; de cursos noturnos e da instalação do curso de direito.
O professor Manuel Nunes Dias tornou-se primeiro pró-reitor num momento muito turbulento da universidade, assumindo a função de reitor por quatro meses: 27 de março a 31 de julho de 1984.
São de sua lavra diversas obras, destacando-se: Depressão Monetária do Século XVI e a Conquista Henriquiana (1959); Partilha do Mar Oceano e Descobrimento do Brasil (1963); O Capitalismo Monárquico Português – 1495-1549: Contribuição para o Estudo das Origens do Capitalismo Moderno (tese de doutorado defendida em novembro de 1957, em dois volumes editados em 1963); O Comércio Livre Entre Havana e os Portos de Espanha (dois volumes, 1965); O Descobrimento do Brasil (1967); A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão – 1755-1778 (dois volumes, 1970); Fomento e Mercantilismo: A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão (1970); El Real Consulado de Caracas – 1793-1810 (1971); e Nova et Vetera: O Descobrimento do Brasil (2000).
Manuel Nunes Dias faleceu em 8 de outubro de 2016, aos 95 anos. Sucedê-lo torna-se para mim uma inaudita honra! À memória dele, mui particularmente, dedico este meu discurso.
Peroração
Sumariando a genealogia da cadeira no 34 da egrégia Academia Paulista de História, bem como levando-se em consideração o áureo lastro que possui esse sodalício, quer através de seus patronos quer através de seus membros titulares, sinto não somente um inefável gáudio, como também um misto de imensa responsabilidade e pequenez, diante de seu notável quadro acadêmico.
Regozijo-me por não estar profissionalmente só nessa honorável grei, mas ao lado da ilustre acadêmica Yvonne Capuano[11], escritora, historiadora, incentivadora da cultura e mulher de grande liderança, ex-presidente da Academia de Medicina de São Paulo (2009-2010) e da Academia Cristã de Letras (2012-2013), dentre muitas outras entidades; assim como o nobre colega e acadêmico Guido Arturo Palomba[12], escritor e afamado psiquiatra forense, igualmente ex-presidente da Academia de Medicina de São Paulo por dois mandatos (2003-2004 e 2007-2008).
Ademais, gostaria de enfatizar que dentre os oito presidentes que teve a Academia Paulista de História, dois foram igualmente médicos: Lycurgo de Castro Santos Filho[13] (1910-1998, Figura 20) que, curiosamente como eu, também foi urologista! Presidiu este sodalício por dois mandatos (1977-1979 e 1980-1982) e, além de professor foi escritor e um dos maiores, senão o maior historiador da medicina brasileira!; Duílio Crispim Farina[14] (1921-2003, Figura 21), obtetra e ginecologista muito erudito, foi possuidor de vasta cultura, destacando-se também como escritor e historiador da medicina brasileira, além de ter sido escolhido para patrono da cadeira no 78 da Academia de Medicina de São Paulo. Ambos também são imortais da honorável Academia Paulista de Letras, tendo Lycurgo de Castro Santos Filho a honra de presidir esse renomado sodalício por dois mandatos: 1983-1984 e 1985-1986.
Figuras 20 e 21 – À esquerda, Lycurgo de Castro Santos Filho, e, à direita, Duílio Crispim Farina.
Com muita humildade, auferida de minha formação familiar, espiritual e profissional, e por benevolência dos doutos membros deste silogeu, ultrapasso com inexprimível alegria os umbrais da gloriosa Academia Paulista de História.
Também resignado com a efemeridade deste galardão, pois na vida tudo é temporário e celeremente passageiro – despojado – faço minhas as verazes e desoladoras palavras proporcionadas pelo tempo, do amigo e grande vate contemporâneo Walter Argento[15], expressas no soneto:
Olhar o Passado
Diplomas, velhos álbuns, ressequidos,
medalhas de vitórias conquistadas,
repousam, todos eles, esquecidos,
no fundo de gavetas desgastadas.
A certo tempo foram merecidos,
hoje, relembram honras já passadas,
prazeres tão fugazes, tempo idos,
do vate, com histórias já cansadas.
Que lhe adiantam louros de vitórias,
ao longo da existência, triunfantes,
apoteose das horas distantes.
Contam-se lutas e se contam glórias,
evocativas de passadas eras,
tantos lauréis, no fosso das quimeras!
Ω
Penso que agradecer é penhorar-se delicadamente. Sou deveras grato ao ínclito professor Paulo Nathanael Pereira de Souza[16] pelas gentis e fraternas palavras com as quais me saudou nesta efeméride. O professor Paulo Nathanael é um nobilíssimo cidadão, além de destacado escritor, pensador e educador deste país; sua pertença enobrece não somente este sodalício, como também a Academia Cristã de Letras, a Academia Paulista de Educação e a Academia Paulista de Letras, dentre outras instituições.
Todos aqueles que o conhecem e têm o privilégio de privar de momentos com ele sentem-se extremamente orgulhosos e enriquecidos. Tive a honra de auxiliá-lo, como tesoureiro, em três dos quatro mandatos que ele bem exerceu como presidente da Academia Cristã de Letras (2006-2007; 2008-2009; 2010-2011 e 2014-2015), momentos que também guardo com muita ternura.
Ω
Ao crepúsculo desta peroração e como profunda gratidão a todos meus nobres confrades e confreiras da Academia Paulista de História, aos quais mui modestamente os reverencio, finalizo, aduzindo mais um pensamento que, reiteradamente, meu inesquecível professor Carlos da Silva Lacaz exortava: “Bem-aventurados os que vivem na glória de seus feitos, no ensino dos discípulos, na sequência dos continuadores. Que os moços saibam recordá-los com imperecível fidelidade”.
Com certeza, todos os senhores e senhoras da Academia Paulista de História são bem-aventurados, pois fizeram de suas existências um modelo a ser seguido; e viverão na memória de tantos quantos tiverem a feliz oportunidade de conhecê-los através de seus feitos e obras.
Muitíssimo grato!
Helio Begliomini
[1] Clio é personagem da mitologia greco-romana e significa “Proclamadora”. Ela era a primeira das nove musas – deusas irmãs, que habitavam no monte Hélicon, ao lado de Euterpe, Talia, Melpômene, Terpíscore, Érato, Polímnia, Urânia e Calíope, a líder delas. Eram filhas de Zeus com Mnemósine e recebiam assistência de Apolo para presidir as artes e as ciências, assim como inspirar os governantes, a fim de estabelecer a paz entre os homens.
Na mitologia grega as musas eram virgens ou, ao menos, não casadas. Clio, por haver se atrevido a criticar os amores de Adonis e Afrodite, a deusa lhe encantou com uma paixão avassaladora por Piero, rei da Macedônia, com quem teve Jacinto. Assim, Clio é considerada a grande deusa da história, das epopeias e da criatividade, aquela que divulga e celebra as realizações.
[2] Discurso de Helio Begliomini como recipiendário, proferido com supressão de diversos trechos pela limitação de tempo, por ocasião de sua posse na cadeira no 34 da Academia Paulista de História, em cerimônia ocorrida no Anfiteatro Olavo Setúbal, do Centro de Integração Empresa-Escola – CIEE, em 9 de agosto de 2018, em São Paulo.
[3] Armand Jean du Plessis (1585-1642), mais conhecido por cardeal Richelieu, também recebeu o título de duque de Richelieu e de Fronsac, foi o primeiro-ministro do rei Luís XIII (1628-1642) e arquiteto do absolutismo na França.
[4] O Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo foi fundado em 1o de novembro de 1894.
[5] Álvaro da Veiga Coimbra presidiu a Sociedade Numismática Brasileira de 19 de abril de 1953 a 19 de janeiro de 1959.
[6] Frei Vicente do Salvador (1564-1636) teve por nome de nascimento Vicente Rodrigues Palha.
[7] Douglas Michalany, titular da cadeira no 10 sob a patronímica José Francisco da Rocha Pombo (1857-1933), presidiu por três mandatos a Academia Paulista de História: 1995-1997; 1998-2000 e 2001-2003. É também o segundo ocupante da cadeira no 19 da Academia Cristã de Letras, tendo por patrono Raffaele Pettazzoni (1883-1959).
[8] Luiz Gonzaga Bertelli é também o terceiro ocupante da cadeira no 32 da Academia Cristã de Letras, tendo por patrono santo Antonio de Pádua e de Lisboa (1195-1231); o fundador da cadeira no 74 da Academia Paulista de Letras Jurídicas, tendo por patrono Fernando Rudge Leite (1912-1987); e o terceiro ocupante da cadeira no 31 da Academia Paulista de Educação, tendo por patrono Pedro Voss (1871-1940).
[9] A cadeira no 10 da Academia Cristã de Letras tem por patronesse Marie Barbe Antoinette Rutgeerts van Langendonck e como membro fundador Tácito Remi de Macedo van Langendonck.
[10] Esses três períodos foram: 1998-1999; maio a julho de 2003, e 2004-2005.
[11] Yvonne Capuano é titular da cadeira no 23 da Academia Paulista de História sob a patronímica de Julio César Ferreira de Mesquita Filho (1892-1969); titular da cadeira no 64 da Academia de Medicina de São Paulo sob a patronímica de Maria Augusta Generoso Estrela (1860-1946); e titular da cadeira no 4 da Academia Cristã de Letras, cujo patrono é Dante Alighieri (1265-1321).
[12] Guido Arturo Palomba é titular da cadeira no 9 da Academia Paulista de História sob a patronímica de Frei Vicente do Salvador (1564-1636); titular da cadeira no 1 da Academia de Medicina de São Paulo sob a patronímica de Luiz Pereira Barreto (1840-1923); e titular da cadeira no 33 da Academia Cristã de Letras cujo patrono é Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976).
[13] Lycurgo de Castro Santos Filho (1910-1998) foi membro fundador da Academia Campinense de Letras; e o terceiro ocupante da cadeira no 23 da Academia Paulista de Letras, tendo por patrono o monsenhor Manuel Vicente Montepoliciano da Silva (1851-1909).
[14] Duílio Crispim Farina (1921-2003) ocupou a cadeira no 11 da Academia Paulista de História sob a patronímica de Frei Gaspar da Madre de Deus (1715-1800); foi o segundo ocupante da cadeira no 27 da Academia Cristã de Letras, tendo por patrono São Lucas (?-84 d.C.), assim como o sexto presidente desse sodalício (1984-1985); e o terceiro ocupante da cadeira no 40 da Academia Paulista de Letras, tendo por patrono José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838), o Patriarca da Independência. Presidiu a Academia Paulista de História por dois mandatos (1989-1991 e 1992-1994).
[15] Walter Argento foi presidente do Movimento Poético Nacional.
[16] Paulo Nathanael Pereira de Souza é o segundo ocupante da cadeira no 8 da Academia Paulista de História, tendo por patrono o padre jesuíta João Antonio Andreoni (1649-1716); segundo ocupante da cadeira no 1 da Academia Cristã de Letras, tendo por patrono Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908); segundo ocupante da cadeira no 7 da Academia Paulista de Educação, tendo por patrono o padre Leonel Edgard da Silveira Franca (1893-1948), entidade que também presidiu; e quinto ocupante da cadeira no 12 da Academia Paulista de Letras, tendo por patrono Paulo Egydio de Oliveira Carvalho (1843-1906).