Vencer aquele jogo garantiria a classificação.
Preocupado, o gorducho Kalil, comerciante forte na pequena e risonha Itaviagra e presidente do time, convidou o compadre Isaque para uma missão especial.
No cair da tarde de sexta-feira, Kalil no volante do seu majestoso Ford Galaxie e o benemérito Isaque de companhia, rodaram mais de dezessete léguas até a periferia da cidade grande.
Já passava das nove da noite ao atingirem o destino. Lá, endereço no bolso da jaqueta, o rechonchudo Kalil e o compadre Isaque desceram uma ribanceira e foram bater na casinha simples onde morava o juiz da partida do próximo domingo.
Sua intenção era subornar o árbitro, mediante uma boa gratificação, para garantir a vitória do Esporte Clube Itaviagra, no duríssimo confronto com o líder do campeonato, o poderoso Fogão de Ouro Futebol Clube.
Atendeu à porta um sujeito franzino, uns 35 anos de idade.
Sem meias palavras, Kalil fez a oferta. Uma quantia de uns cinco contos de réis, na época. Mais ou menos uns dez paus no dinheiro atualizado. O quase subornado escancarou a porta e pediu que fizessem o favor de entrar.
Então, apontou para o canto da sala pouco iluminada, onde três crianças dormiam em colchões no chão.
A esposa, quase despercebida, parecia cochilar na cadeira ao fundo. E o magricela falou: “vocês vieram de longe até minha casa querendo me comprar? Sou pobre, mas sou honesto.
Se eu me vendesse, nunca mais teria coragem de olhar para minhas crianças”.
Isaque não sabia onde esconder a cara e foi saindo de fininho, enquanto o cartola Kalil balbuciava um envergonhado pedido de desculpas.
Subiram a ladeira resfolegando.
Na volta Kalil disse: “pelo menos temos uma certeza, um árbitro imparcial apitará o jogo”.
No domingo, quatro da tarde a torcida em peso lotou o estádio com seus mil quinhentos e trinta lugares.
E os torcedores viram o juiz marcar, logo no começo da partida, um pênalti duvidoso para o Fogão de Ouro.
Cobrança magistral de Cachimbinho abrindo a contagem para o time visitante.
Durante o resto do jogo o ataque Itaviagrense martelou, martelou, sem sucesso.
O juiz, cara enfezado, amarrava o jogo. Apitava faltas inexistentes a favor do time da casa, mas lá longe, no meio do campo. Quando o Itaviagra atacava, o juizão marcava impedimento.
Foi uma vergonha. Acabou o jogo, vitória do líder pela contagem mínima. O juiz saiu escoltado no carro da polícia e a torcida ficou urrando, sem chance de pegar o safado.
Um mês depois, Kalil soube de tudo. Aquele juiz honesto já tinha se acertado com o mandachuva do Fogão de Ouro.
Lázaro Piunti -