Quando se diz que “Jesus morreu”, podemos ser induzidos a um equívoco, como se tivesse morrido de alguma doença ou desastre.
Jesus foi assassinado, após um simulacro de julgamento e uma sentença proferida por autoridade romana, instigada por lideranças religiosas judaicas. A pena recebida, a crucifixão, era a destinada a crimes políticos (os crimes religiosos eram punidos com o apedrejamento), como se ele fora organizador de alguma sedição ou pusesse em risco as estruturas do império.
Jesus foi eliminado porque pregou um Reino de misericórdia e de uma paz desconhecidas pelos poderosos, que acreditavam na ideologia da “pax romana”, fundada sobre a violência, as armas, as mentiras, o expansionismo, a inclemência, a morte. Passou sua breve vida anunciando este Reino, adotando um estilo de vida que o identificava, para quem esperasse com fé a vinda do Messias de Israel, como o salvador de todos, mas com o coração voltado sobretudo para os míseros (misericórdia), os pobres, os doentes, os pecadores, as ovelhas perdidas, os mais necessitados.
Para o Novo Testamento a morte faz parte da vida, pois a vida não é unicamente a existência. Cumprida uma missão, tal como a semente que morre para fazer germinar uma nova vida (Jo 12,24-26); ou como na multiplicação dos pães (Jo 6,12) em que todos os restos, até as migalhas são recolhidas, assim também do amor do Pai nada de nossa vida pode ser sem sentido.
Aos olhos dos indiferentes ou dos incrédulos, sob a ótica da vida mundana Jesus foi um fracassado. Mas houve muitos que se deixaram tocar pela sua Palavra de justiça e de amor, como aconteceu com o centurião, segundo Mc. 15,39: “Verdadeiramente este homem era o Filho de Deus”. Na verdade, os que o levaram à morte é que foram julgados. Jesus nunca foi réu, foi o verdadeiro Juiz, aquele que conheceu e proclamou a Verdade que liberta (Jo 8,32).
Jesus continua morrendo, crucificado em todos os humilhados e ofendidos de nosso mundo, de nosso tempo. Jesus continua ressuscitando em todos os que acolhem, protegem e incentivam a vida, em todas as circunstâncias. O Cristianismo, a Igreja, nós existimos para que trabalhemos pela vida em plenitude. No mais belo título que Deus recebeu no Antigo Testamento, ele é chamado de o “Amigo da Vida” (Sb 11,26).
Santo Agostinho assim resumiu este mistério da Paixão e Ressurreição de Jesus Cristo: “Desceu até nós a nossa própria Vida, suportou a nossa morte e matou-a com a abundância de sua Vida.”
(*) Jornalista profissional e professor de Filosofia, membro da Academia Cristã de Letras.